alma açoriana
copiei este bonito artigo publicado no Jornal Açoreano Oriental a 13 de Junho de 2011
Identidade açoriana
Somos de alguma parte, de uma terra, de um país.
Dentro de nós há um lugar, que surge como um filme que se revê, sempre
que fechamos os olhos. Cores, cheiros e até sons ou vozes animam a tela
da nossa mente, quando recordamos lugares de infância, a casa dos avós
ou a freguesia onde ainda temos família, que agora visitamos nas férias.
Um lugar onde aprendemos a ser pessoas e onde, quis o destino,
aprendêssemos a falar com um determinado sotaque e onde aprendemos a
descobrir quem somos e porque estamos aqui.
Dentro de nós há
raízes profundas que nos agarram por dentro e, por mais que viajemos,
representam um lugar seguro, onde respiramos melhor e nos sentimos em
casa.
A identidade é essa forma própria de ser, que não se
molda nem se desfigura, que não se verga nem pode ser destruída, mesmo
quando os dramas da história comprometem a sua existência, como
aconteceu com comunidades da América latina, exterminadas pela
colonização, que hoje sobrevivem no seu património e sabedoria
ancestrais.
Dentro dos açorianos, há uma fibra que não se
verga, uma rocha que não quebra, um cheiro a mar que não se apaga.
Dentro de cada açoriano, há a certeza de pertença a estas ilhas, mesmo
quando o destino quis que vivessem longe, em terras da emigração ou no
continente. Dentro daqueles que, não sendo açorianos, adoptaram esta
terra por sua, há um sentimento de pertença. E não é por acaso.
Viver nestas ilhas cria raízes. É difícil escapar à força desta gente
que soube transformar pedreiras em terras de pão, enfrentou baleias em
mar alto e se defendeu dos ataques da pirataria.
A identidade
açoriana dificilmente pode ser entendida fora do universo de crenças que
marca a história deste povo, que viu na natureza a força de um Deus que
castigava e na oração um laço que transformava o medo em esperança. As
romarias, as coroações, os bodos de leite e as promessas são bem a
imagem desse povo crente que, perante a desgraça se volta para o outro,
reforça a solidariedade e é capaz de mudar de vida.
Somos um
povo de crentes, por isso o Espírito Santo não é apenas mais uma
festividade, mas a expressão da própria identidade açoriana. Durante
semanas, as famílias que aceitam uma “dominga” nas suas casas, rezam em
comunidade; os mordomos que se dispõem a organizar a festa, preparam as
pensões, as dádivas e fomentam a partilha.
Em dia de festa, a
coroação é sem dúvida o seu momento mais importante, mas quem é coroado é
sempre o mais humilde, aquele que se dispõe a aceitar a protecção do
divino.
Somos um povo de gente humilde que aprendeu, na
adversidade, a partilhar a fartura e a se alegrar com isso. Não se
recusam convivas à mesa das sopas e ninguém nega um lance nas
arrematações, em louvor do Senhor Espírito Santo.
Somos um
povo com raízes. Raízes no mar, mas que identificam e nos prendem a
estes pedaços de terra onde nos sentimos em casa, envoltos pelo cheiro
do incenso que cobre o chão dos quartos, em dia de festa, e veste as
ruas em dia de procissão.
Não há melhor traço para unir os
açorianos, onde querem que vivam, do que invocar o Espírito Santo, que o
povo aprendeu a venerar, fora e dentro das igrejas.
Por isso,
o povo se sente identificado por ser na oitava da festa de Pentecostes
que a Região festeja o seu dia e reaviva as suas raízes, que afirmam e
distinguem a açorianidade.
(publicado no Açoriano Oriental, a 13 Junho 2011 - Dia dos Açores)
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