in diálogos lusófonos
Há
áreas de estudo que em Portugal sempre foram claramente “deficitárias”.
Até há bem pouco tempo, pouco havia a apontar quando se tentasse fazer
um apanhado sobre os estudos judaicos no nosso país.
Apesar
da importante herança que a cultura judaica nos deixou, visível de
forma clara e
inequívoca nos escassos momentos em que cientificamente Portugal esteve
na vanguada do Ocidente, a verdade é que muito pouco se estudava sobre
os judeus portugueses, sobre a judaísmo em terra lusas.
Depois
do 25 de Abril, já nas décadas de oitenta e de noventa, vários foram os
actos oficiais do Estado que tentaram reparar e dar atenção às feridas
seculares entre o Estado português e os judeus de origem lusa.
Desde
a expulsão lançada por D. Manuel, passando pela perseguição realizada
pela Inquisição, à própria forma confessional que o Estado Liberal ainda
apresentava no início do século XX, fazendo com que, por exemplo, a
Sinagoga de Lisboa (construída entre 1902 e 1904) não pudesse ter
fachada para a rua... tudo isto tem sido matéria de remorsos e de
arrependimentos
profundamente lançados numa quase flagelação expiatória que,
espantemo-nos, em muito pouco resultou a nível da investigação histórica
e cultural.
Foi
das mãos da própria comunidade judaica de Lisboa (Associação Portuguesa
de Estudos Judaicos) que em 1994 nasceu a primeira revista sobre
temáticas judaicas em Portugal, a Revista de Estudos Judaicos. Em 1994,
aquando da Lisboa 94 (capital Europeia de Cultura) na Fundação Calouste
Gulbenkian surgia uma marcante exposição Os Judeus Portugueses entre os Descobrimentos e a Diáspora.
Mas
as exposições eram claramente epifenómenos marcantes num espaço
cultural e científico a necessitar de uma maior dinamização; o mesmo se
passava com alguns congressos e colóquios então realizados, à imagem da
revista Revista
de Estudos Judaicos que nunca teria uma frequência e uma continuidade
desejada.
Significativamente,
a segunda metade da década de noventa viu um grande crescimento dos
estudos nesta área. Em 1997 nasceu a Cátedra de Estudos Sefarditas
«Alberto Benveniste», na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa,
com a direcção do Prof. Doutor Marques de Almeida. O número de
colóquios, de cursos livres, de ciclos de conferências, cresceu
indubitavelmente: assumiu-se o peso histórico da herança judaica
portuguesa no dia-a-dia da investigação e não apenas em momentos de
catarse do Estado.
A
herança cultural judaica de Portugal começava a ser estudada de forma
mais sistemática e enquadrada em instituições propositadamente criadas
para tal.
Mas o efectivo boom está a dar-se neste momento. O ano de 2002 viu nascer a nova série da Revista de Estudos Judaicos, tal como viu nascer a revista Cadernos de Estudos Sefarditas, da Cátedra de Estudos Sefarditas «Alberto Benveniste».
Se
em termos de revistas a situação se alterou radicalmente em escassas
semanas, em termos de centros de investigação as alterações são também
espantosas. Até ao início de 2002 apenas existiam as já referidas
Cátedra de Estudos Sefarditas e a Associação Portuguesa de Estudos
Judaícos. Ora, acabam de ser criados mais dois pólos de investigação, um
na Universidade da Beira Interior, e outro na Universidade de
Trás-os-Montes e Alto Douro.
Os
esforços
centrados em investigadores isolados, referimos especialmente o caso da
Professora Maria Antonieta Garcia na Universidade da Beira Interior,
começam a dar os seus frutos. A situação, e esperemos que não se trate
de um epifenómeno, de algo de moda, está claramente a modificar-se.
A
crescente atenção e interesse pelos fenómenos religiosos do presente e a
sua relação com o passado, está a alterar profundamente o espaço
cultural que até agora dávamos ao estudo das religiões e, em especial,
ao estudo sobre a nossa herança judaica, sefardita.
Estaremos
perante um fenómeno de moda, de predisposição momentânea, passageira,
ou o nosso quadro de visão do “outro” estar-se-á a alterar? O que é
claro é que a institucionalização está a ser francamente reforçada, com
tudo o que de estabilidade esse facto confere á investigação. Esperemos
para ver e, melhor ainda, para saborear.
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