domingo, 22 de abril de 2012

HISTÓRIA: Samora Machel contra a execução de Uria Simango


CRÓNICA exotérica

por Yahia ben Yokhanon (alias João Craveirinha)

Samora Machel contra a execução de Uria Simango

(Segundo texto apócrifo de Zoao Kraveirinya na era do Tsuname)

Nachingueia, Farm 17, sul de Tanzânia. Manhã de um dia diferente no
mês de Janeiro de 1975. Alguns Homens e mulheres abatidos estão
perfilados perante Samora Machel e o então 1º Ministro Joaquim
Chissano, passando revista e verificando até que ponto a “sessão” da
noite anterior no mato (até ao amanhecer), tinham causado danos
físicos aos apresentados. O destino desses homens e mulheres estão em
jogo.

Samora Machel dirige-se ao veterano nacionalista, Adelino Gwambe, com
a saudação: - “kundjane uá li kaya?” (Como estás patrício da terra?).

- Adelino Gwambe responde com altivez de mãos nos bolsos: …”chauane
mufana uá mina”…(olá meu miúdo) …

Valentim o Pide tetense, mestre da tortura, “reconvertido”, e os
guardas de capacete de imediato tiram-lhe as mãos dos bolsos com
rispidez. Mas Adelino uá kaGuambe, coloca-os de novo nos bolsos em
desafio. E Samora sorri condescendente.

Adelino Gwambe (protegido de Kwame Nkrumah e de Mao – Tse - Tung). A.
Gwambe, na década de 1950, sem dúvida o jovem moçambicano mais
dinâmico no nacionalismo Africano clássico. E Marcelino dos Santos no
exterior (na Europa e norte de África), outra “bandeira” do
inconformismo nacionalista mais à esquerda. “Apadrinhado” pelo Rei
Hassan de Marrocos, pelo francês George Marchais do Partido Comunista
Francês e ainda por Mao - Tse -Tung líder da revolução chinesa.
Conviveu com a resistência argelina de Ben Bela.

Regressando a esse dia, algures do mês de Janeiro de 1975, em
Nachingueia, estão também perfilados: - Uria Simango ex –
vice-presidente e sua esposa Celina Muchanga ex Presidente da LIFEMO;
Paulo Gumane (co-fundador da FRELIMO e Presidente do COREMO baseado em
Zâmbia); o ex-comandante da FRELIMO, Januário Napulula (rendeu-se aos
portugueses em 1971); Joaquim Nhaunga (idem em Cabo Delgado); Pedro
Simango ex – 1º comandante de mísseis portáteis terra – ar
(entregou-se em Tete em 1972); Judas Honwana (ex - representante da
FRELIMO no Cairo apoiou Uria Simango em finais de 1969 depois do
Manifesto “ Gloomy Situation in FRELIMO”. apresentou-se
voluntariamente à FRELIMO em 1974); Lázaro Kavandame; Kambeu;
Veronika; Pascoal Almeida Nhampulo, ex comandante em Cabo Delgado
muito corajoso (do tempo de Filipe Magaia). João Craveirinha do DIP,
desiludido e “refugiado” em Nairobi (Quénia). “Empurrado” entrega-se
em Lourenço Marques em Junho 1972. Após “conversações à distância”
apresenta-se em Dar – es – Salaam em 1 de Agosto de 1974 onde é preso
numa cave subterrânea alagada, no centro da cidade. Mais tarde
(1975/1976) levado para Nachingueia e Niassa. Amnistiado em Abril de
1976 por Samora Machel em Maputo.

Outro dissidente, Lourenço Mutaca, separado de todos “passeia” em
Janeiro 1975, num jeep russo com Samora Machel que lhe mostra o campo
de Nachingueia. O regressado (dissidente muito activo), Lourenço
Mutaca, “apadrinhado” pela Suécia é poupado. Reintegrado mais cedo no
Moçambique Independente como quadro superior. Todavia, misteriosamente
anos mais tarde é assassinado em Adis Abeba (Etiópia) para onde tinha
sido destacado por uma Organização Internacional, autorizado pela
Frelimo.

Da enorme lista de dissidentes detidos constam ainda os nomes de Casal
Ribeiro (um dos fundadores da FRELIMO pela Unamo de Tete) e refugiado
desde finais de 1969 no norte de Tanzânia. Narciso iNbule um dos
fundadores da Frelimo e oposicionista da 1ª hora ao movimento. Basílio
Banda ex – estudante do Inst. Moç. Unhai (médico com consultório na
Beira em 1974). Marqueza (engenheiro agrónomo) e Júlio Razão todos
bolseiros da FRELIMO. Presente Joana Simeão vítima de cálculos
políticos errados e manipulada pelo General Costa Gomes e antes por
Jorge Jardim (ambos portugueses). De Blantyre (Malawi), Joana Simeão é
induzida em erro por Kambeu (Direito Internacional), professor de
Liceu na Beira. Kambeu ingenuamente acreditava num multipartidarismo
em Moçambique. Joana Simeão regressa e é presa no aeroporto.

O deputado de Salazar, Marcos Assahel Mazula, é preso em Niassa em
finais de 1974. Ia visitar os familiares. Vinha de Nampula onde
residia, quando não estava em Lisboa. A ordem de prisão partira de
Mário Sive na regência do governo em Vila Cabral (hoje Lichinga).

…” Prendemos! Não matamos! Porque são inimigos políticos!”…Diria mais
tarde, Samora Machel, em 12 de Maio de 1975 em Nachingueia num mega
comício –, (centenas de recrutas e convidados), com a presença dos
Presidentes da Zâmbia e Tanzânia.

K. Kaunda, Samora M., J. Nyerere

E numa entrevista concedida à RTP (Rádio Televisão Portuguesa), em 27
de Maio de 1975 (terça-feira), sobre a abolição das prisões e pena de
morte depois da Independência, teria dito Samora Machel: …”Porque caso
contrário teríamos permitido a criação de assassinos no nosso
exército. Assassinos que não respeitam vidas humanas. Nós evitamos
isso. Não queremos fuzilamentos.” (…)” Portanto, o trabalho político,
o trabalho ideológico -, achamos que este é o instrumento fundamental
para transformar o homem. Porque todo o homem se transforma não é
preciso prisão (ou) paredes. O que há é a reeducação do povo.” (fim de
citação). No entanto ele mesmo, Samora Machel, seria ultrapassado pelo
demasiado Poder em mãos alheias, daí talvez, sem a consulta prévia,
tenham surgido ordens para matar e deixar em cinzas a maioria dos que
ali condenados e humilhados lhes prometera um dia conceder amnistia
geral depois de apresentados em mega comício no Estádio da Machava. No
fundo, reconhecendo o direito (humano), a “serem libertados e
contribuir” apesar de “terem traído a Luta pela Independência”. Esse
era o espírito de Samora Moisés Machel, dentro do seu peculiar
pragmatismo um tanto ao quanto “naïve ou ingénuo”.

E em 1975 indiferentes aos vários dramas e tragédias, o povo do Rovuma
ao Maputo, continuava a entoar com fervor as canções militantes de
Nachingueia (Nachingwea). “Tchengera, kapriconi ku Moçambique, lero.
Tchengera, tiri, hokonguera, kumenha inkondo. Tchengera, ku Cabo
(Delgado), ku lero, kuli ana uá Samora, tchengera. (tradução livre:
atenção, hoje - agora, inimigos de Moçambique, atenção, com Samora
estamos preparados para a luta, para a guerra, em Cabo Delgado, Niassa
(etc)”.
João Craveirinha: Jornal “O Autarca” da Beira de 11 de Maio de 2006,
quinta – feira.

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