Ruy Belo _ Portugal
( 1933 – 1978 )
MORTE AO MEIO DIA
No meu país não acontece nada
à terra vai-se pela estrada em frente
Novembro é quanta cor o céu consente
às casas com que o frio abre a praça
Dezembro vibra vidros brande as folhas
a brisa sopra e corre e varre o adro menos mal
que o mais zeloso varredor municipal
Mas que fazer de toda esta cor azul
que cobre os campos neste meu país do sul?
A gente é previdente cala-se e mais nada
A boca é pra comer e pra trazer fechada
o único caminho é direito ao sol
No meu país não acontece nada
o corpo curva ao peso de uma alma que não sente
Todos temos janela para o mar voltada
o fisco vela e a palavra era para toda a gente
[…]
O meu país é o que o mar não quer
é o pescador cuspido à praia à luz do dia
pois a areia cresceu e a gente em vão requer
curvada o que de fronte erguida já lhe pertencia
A minha terra é uma grande estrada
que põe a pedra entre o homem e a mulher
O homem vende a vida e verga sob a enxada
O meu país é o que o mar não quer
(de “Boca Bilingue”)
Poeta da inquietação de raízes ontológicas (com pontas de interrogação religiosa que se foi tornando cada vez mais laica), esteve ligado à revista “Rumo”, à Editorial Aster e à União Gráfica. Publicou “Aquele Grande Rio Eufrates” (1961), a que se seguiram, entre outros, “O Problema da Habitação” (1962), “Boca Bilingue” (1966), “Homem de Palavra(s)” (1970), “Transporte no Tempo” (1973), “Toda a Terra” (1976), “Despeço-me na Terra da Alegria” (1977).
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