Terça-feira, 7 de Junho de 2011
UMA ESTRATÉGIA LUSÓFONA PARA A ONU
PAULO GORJÃO* - PÚBLICO
O aprofundamento da cooperação entre os países de língua portuguesa ainda tem muito caminho para percorrer
Os temas passíveis de coordenação tanto podem ser assuntos menos imediatos - a reforma do Conselho de Segurança, a protecção dos global commons, ou institucionalização do português como língua oficial da ONU - como tópicos mais urgentes. A Guiné-Bissau e Timor-Leste, por exemplo, são temas abordados semestralmente no Conselho de Segurança, uma vez que a ONU está presente nos dois países através da UNIOGBIS e da UNMIT, respectivamente. Acresce que os países da CPLP candidatam-se regularmente a cargos ou instituições no universo da ONU. O Brasil está neste momento fortemente empenhado na candidatura de José Graziano da Silva - ex-ministro de Lula da Silva - ao cargo de director--geral da FAO de 2012 a 2015, cuja eleição decorrerá entre os próximos dias 25 de Junho e 2 de Julho. Por sua vez, a candidatura portuguesa ao Conselho de Direitos Humanos, para o triénio de 2014 a 2017, começa agora a dar os seus primeiros passos. Em suma, não faltam temas em que a coordenação das respectivas posições contribuirá para, directa ou indirectamente, salvaguardar os interesses dos diversos estados-membros da CPLP.
A actual presença do Brasil e de Portugal no Conselho de Segurança contribuiu seguramente de forma decisiva para que fosse tomada esta decisão de instituir encontros regulares em Nova Iorque. Receio, porém, que as reuniões corram o risco de perder a sua regularidade com o fim dos mandatos do Brasil, em Dezembro de 2011, e de Portugal, em Dezembro de 2012, no Conselho de Segurança. Seria um erro se tal acontecesse, reflectindo aliás uma visão redutora e minimalista dos benefícios oriundos da coordenação. A necessidade e os benefícios desta coordenação não se esgotam na presença de países de língua portuguesa no Conselho de Segurança.
O caminho a seguir deverá ser o do aprofundamento da coordenação tendo como ponto de partida os interesses convergentes. Não se compreende, por exemplo, que não haja uma estratégia coordenada entre os países de língua portuguesa que enquadre as diversas candidaturas ao Conselho de Segurança da ONU. A presença sobreposta de países de língua portuguesa em determinados anos contrasta com os períodos em que nenhum estado-membro da CPLP esteve presente no Conselho de Segurança. A descoordenação não poderia ser mais evidente, apesar do interesse comum ditar que deveria suceder, sempre que possível, o contrário.
Naturalmente, partilhar a mesma língua não impede que haja por vezes interesses divergentes. De forma realista, a coordenação de posições não pretende erradicar as divergências, mas antes maximizar os benefícios nos casos de convergência de pontos de vista. No fundo, o que surpreende na decisão da semana passada não é o facto de ter sido tomada, mas, sim, o facto de só agora ter sido tomada. Esta revela sem querer como o aprofundamento da cooperação entre os países de língua portuguesa ainda tem muito caminho para percorrer.
*Director do Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança (IPRIS) - Escreve à terça-feira
in diálogos lusófonos
http://paginaglobal.blogspot.com/2011/06/uma-estrategia-lusofona-para-onu.html
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