sábado, 18 de agosto de 2012

identidade moçambicana

in di+alogos lusófonos

Opinião a refletir

A palavra a um moçambicano

Aportuguesamento da nossa identidade

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SR. DIRECTOR!
De todas as vezes que faço uma reflexão sobre a ditadura do colonialismo português em países lusófono-africanos, sobretudo e particularmente, no nosso país nunca me escapa a percepção de que o mal colonial mais grave que presidiu o passado e continua ladeando o presente com o agouro de se perpetuar pelo futuro afora foi e continua a ser o aportuguesamento da nossa identidade.
Maputo, Sexta-Feira, 17 de Agosto de 2012:: Notícias
É um mal cultural que, analisado duma maneira míope e superficial, nos parece não dispor duma fisionomia própria do mal, de tal sorte que nunca lhe demos a devida atenção em muitos dos nossos debates culturais. Mas, quando se esbugalham os olhos da razão em direcção ao objecto, este nos desvenda nitidamente o seu âmago a sorrir-nos com ar de vergonha. Tal acto, os meus olhos fizeram, quando me ocorreu a mim a seguinte inquietação: porque nós, moçambicanos de África, nos identificamos com nomes alheios, aportuguesados, do Ocidente?
A história oral dos nossos avôs responde-nos que isto fora uma artimanha religiosa encontrada pelo homem branco para perpetuar os nomes portugueses dos seus pais, heróis, amantes nos nossos filhos, na geração da então (província ultramarina) aquando da colonização mental. Assim sendo, os nossos nomes africanos deveriam tombar oficialmente em desuso, pois o colono nos impigia que não eram nomes de gente, mas de maus espíritos que nos atrasavam o desenvolvimento e, no entanto, para cuja expulsão estava pronta a Igreja Católica.
Dessa forma, ocorria no registo e, ou, no baptismo que o moçambicano que tivesse ou tivesse que ter o nome belo, viril e africano como Muzila, Manicusse, Ulalapi, Nyelete, Sumbi, Horera, Maluwha, Rassi, etc, passaria a dispor dum nome português, porém bonito, mas não como nosso e nem nosso como se vê em Erasmo, José, Catarina, Filipe, Aida, Maria, Armando, Jorge..., ou seja, dá-se um passo de Ngungunhane para Dom Dinis. E, como se não bastasse o massacre nominal, “torturou-se” os apelidos.
Alguns foram substituídos e os outros maquilhados como se vê em Mandlate – que soa formidável! – para Manjante; Mabjaia para Magaia; de Mondlane para Monjane – decerto que isto soa cómico e ridículo! Mas o mais cómico ainda são os nomes que nem sequer têm o apelido no bilhete de identidade. Porquê?! Quiçá por que o apelido era tanto do diabo que já nem a troca, nem a maquilhagem, nem água benta servir-lhe-iam para merecer identificar alguém. Sei lá os pretextos estapafúrdios que apresentaram aos pais do menino negro que, oficial e portuguesamente, ficou conhecido por Hélder Luís Augusto.
O certo é que o colono foi-nos ardiloso e carapeteiro, nos matrecou formidávelmente a ponto de hoje termos esquecido as causas do mal e tornarmo-lo um nosso amigo quando, por nosso belo prazer e não mais pela coacção dos salazaristas, baptizamos nossos filhos com nomes alheios.
Diante desta bagunça com pouca originalidade cultural, ainda se vê grandes figuras da cultura abraçando nomes mais distantes da nossa terra e da terra daqueles que, ao menos, têm connosco alguma afinidade histórica. São figuras das artes que muito aprecio mas que vou referir – é que tenciono ser homo-liber, sem papas na língua. Refiro-me a esta jovem negra com uma voz suave que acalenta o coração até duma fera desvairada, Lizha James, - e porque não optou por Elisa Jaime? Não é bonito?! – Dama do Bling! E porque não foi por Dama do Fulgor? Não tem estilo?! E Mr. Bow, o nosso jovem de pandza que canta tão bem em nossa chi-xangana foi ironicamente se identificar com um nome britânico. Com esse nome, ele nos parece a nós ser, numa primeira partida, um cantor anglófono exilado no país.
Julgo ser essa mesma falsa primeira impressão que o estrangeiro tem dos nossos moçambicanos com nomes portugueses e anglófonos. Ou seja, antes de o conhecer e querendo julgar a sua nacionalidade através do nome, ele, o estrangeiro, pode razoavelmente pensar que deve se tratar dum inglês, e se não o for, talvez um americano, ou deve tratar-se dum português e, na próxima hipótese, um brasileiro por aí. Mas talvez haja alguém que o corrija: não, doutor, ele é da África, é um moçambicano.
-Moçambicano?!...com este nome completo dum português?! – é o colonialismo, doutor. – colonialismo?! Mas isto morreu com o passado. – desculpe, doutor, é o fruto da colonização mental. – ah, está bem. Mas épa, há que se livrar disto. Ou essa gente ainda não sabe a importância de se ter um nome da pátria?! Não sabe que o homem se imortaliza com o nome?! Não sabe que houve pensadores, artistas, atletas, soldados e líderes que fizeram da vida uma grande coisa só para que fossem honrosamente lembrados no futuro, para que seus nomes não fossem apagados na memória do mundo e continuassem na boca dos vindouros?!
  • Hélder Tsemba
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