terça-feira, 27 de dezembro de 2011

a brincar com o AO




 
Quando eu escrevo a palavra acção, por magia
ou pirraça, o computador retira automaticamente
o C na pretensão de me ensinar a nova grafia.

De forma que, aos poucos, sem precisar de ajuda,
eu próprio vou tirando as consoantes que, ao que
parece, estavam a mais na língua portuguesa.

Custa-me despedir-me daquelas letras que tanto
fizeram por mim.

São muitos anos de convívio.

Lembro-me da forma discreta e silenciosa como
todos estes CCC's e PPP's me acompanharam em
tantos textos e livros desde a infância.

Na primária, por vezes gritavam ofendidos 
na
caneta vermelha da professora:  - não te esqueças
de mim!

Com o tempo, fui-me habituando à sua existência
muda, como quem diz, sei que não falas, mas
ainda bem que estás aí.

E agora as palavras já nem parecem as mesmas.

O que é ser proativo?

Custa-me admitir que, de um dia para o outro,
passei a trabalhar numa redação, que há 
espetadores nos espetáculos e alguns também nos
frangos, que os atores atuam e que, ao segundo
ato, eu ato os meus sapatos.

Depois há os intrusos, sobretudo o R, que tornou
algumas palavras arrevesadas e arranhadas,
como neorrealismo ou autorretrato.

Caíram hifenes e entraram RRR's que andavam errantes
 
É uma união de facto, e  para não errar tenho a
obrigação de os acolher como se fossem família.
Em 'há de' há um divórcio, não vale a pena criar
uma linha entre eles, porque já não se entendem.

Em veem e leem, por uma questão de
fraternidade, os EEE's passaram a ser gémeos,
nenhum usa (^^^) chapéu.

E os meses perderam importância e dignidade;
não havia motivo para terem privilégios. Assim,
temos  janeiro, fevereiro, março, são tão
importantes como peixe, flor, avião.

Não sei se estou a ser suscetível, mas sem P,
algumas palavras são uma autêntica deceção,
mas por outro lado é ótimo que já não tenham.

As palavras transformam-nos.

Como um menino que muda de escola, sei que
vou ter saudades, mas é tempo de crescer e
encontrar novos amigos.

Sei que tudo vai correr bem, espero que a
ausência do C não me faça perder a direção, nem
me fracione, e nem quero tropeçar em algum
objeto. 
 
Porque, verdade seja dita, hoje em dia, não se
pode ser atual nem atuante com um C a
atrapalhar.

Só não percebo porque é que temos que ser NÓS
a alterar a escrita, se a LÍNGUA É NOSSA ...? ! ? ! ?
 
Os ingleses não o fizeram, os franceses desde
1700 que não mexem na sua língua e porquê nós?
 
Ou atão deichemos que os 35 por cento de anal
fabetos afroamaricanos fassão com que a nova
ortografia imponha se bué depréça ! .

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