segunda-feira, 10 de setembro de 2012

BRASIL E CAFÉ

in diálogos lusófonos

Memória Lusófona

Descubra o galã Palheta que deu o café ao Brasil

por LEONÍDIO PAULO FERREIRAHoje

Se o Brasil é o maior produtor mundial de café deve-o a Francisco de Melo Palheta. Nascido em Belém do Pará e filho de um português de Serpa, o militar feito diplomata foi em 1727 até Caiena, na Guiana francesa, para resolver uma disputa fronteiriça. Mas se essa era a sua missão oficial, na realidade o que Palheta procurava era grãos de café, tesouro de origem etíope que nas Américas do início do século XVIII poucos possuíam. Galã antes de época, terá seduzido a mulher do governador da colónia francesa, que na despedida lhe ofereceu um ramo de flores com sementes escondidas.

O episódio que imortalizou Palheta é só nota de rodapé num brilhante livro que a Casa das Letras acaba de publicar. Mas confirma ser o génio dos homens, mais o acaso da história, aquilo que explica o planeta onde vivemos, afinal a tese de1493 - A Descoberta do Novo Mundo Que Cristóvão Colombo Criou, de Charles C. Mann.

Há muitos portugueses, luso-brasileiros e brasileiros citados ao longo das 600 páginas do livro do jornalista americano. Justíssimo, porque desde a chegada do tabaco à China em 1549, até à febre da borracha na Amazónia do século XIX, passando pela transferência da vila de Mazagão de Marrocos para o Brasil em 1770, as gentes de língua portuguesa competem com as de fala espanhola, inglesa, holandesa e francesa no esforço de globalização que as Descobertas desencadearam.

E não faltam outros episódios surpreendentes no livro de Charles C. Mann, mesmo sem intervenção portuguesa. Como o papel decisivo dos mosquitos (da malária) na derrota dos britânicos na Guerra da Independência Americana ou os fornecedores de ossos para as fábricas de adubo a vasculharem os campos de batalha de Waterloo e de Austerlitz.

Mas voltemos a Palheta, que do seu mérito se sabe tudo (o Brasil colhe por ano três vezes mais café do que o Vietname, segundo país produtor), mas da sua vida pouco, alimentando o mito. Já se escreveu muito sobre a personagem, até existe um documentário luso-brasileiro (claro!) intitulado Sementes de Ouro Negro, mas nunca é de mais homenagear a forma galante como o diplomata serviu a sua causa.

Vasco da Gama usou o terror para se apoderar do comércio das especiarias, ficando com a fama de cortar narizes e orelhas aos indianos. Já o britânico Henry Wickham traiu os brasileiros que o acolheram ao roubar as sementes da seringueira e fazendo assim a árvore-da-borracha expandir-se pelo Sudeste asiático então pertença da coroa inglesa. Mas Palheta (e aqui o mito vale tudo) serviu-se da paixão para benefício económico da sua pátria.

O Brasil é já a sexta potência económica. Produz hoje tudo, de petróleo a aviões, mas a agricultura continua a contar muito para a riqueza nacional. E graças às artes de um luso-brasileiro que viveu há três séculos, hoje esse país com 200 milhões de pessoas é o rei do café. E isso não é uma nota de rodapé. É um marco da globalização.

http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=2761166&seccao=Leon%EDdio%20Paulo%20Ferreira&tag=Opini%E3o%20-%20Em%20Foco&page=-1

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