quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

NARA LEÃO RECORDADA HOJE

IN DIÁLOGOS LUSÓFONOS

MEMÓRIA » Eternamente moderna Nara Leão faria 70 anos hoje. Cantora, que descobriu e revelou muitos artistas, ganha homenagem em site criado pela filha e deve ter musical remontado em breve

Ana Clara Brant
Publicação: 19/01/2012 - última página do caderno CULTURA do jornal ESTADO DE MINAS.
O ano era 1966. O Brasil vivia uma ditadura militar e vários artistas começaram a desafiar o sistema vigente. A então musa da Bossa Nova, Nara Leão, foi uma das vozes que se levantaram contra os militares e acabou sendo retaliada pelo corajoso ato. Em sua defesa, ganhou estes versos do poeta Carlos Drummond de Andrade: “Meu honrado marechal dirigente da nação, venho fazer-lhe um apelo: não prenda Nara Leão (...) A menina disse coisas de causar estremeção? Pois a voz de uma garota abala a Revolução? Narinha quis separar o civil do capitão? (…) Será que ela tem na fala, mais do que charme, canhão? Ou pensam que, pelo nome, em vez de Nara, é leão?”

A atitude da artista mostra que o jeito de menina frágil e delicada era só aparência. A cantora capixaba abre hoje o clube dos artistas que em 2012 completam 70 anos de vida. Praticamente nenhum evento, tributo ou lançamento marcam as comemorações, e para não deixar a data ficar em branco, a filha mais velha da artista, Isabel Diegues, acaba de criar um site (www.naraleao.com.br) em homenagem à mãe. “ Em 19 de janeiro de 2012, minha mãe faria 70 anos. E esse é o meu presente: compartilhar sua obra para que todos possam se deliciar, ouvir e pesquisar à vontade”, declarou Isabel em sua página no Facebook.

O endereço na internet traz uma cronologia da vida e da carreira de Nara, galeria de fotos, vídeos e áudios. As caixas com as coletâneas de seus discos lançadas em 2002 e 2005 são raridades nas lojas e um dos presentes que ela deve ganhar em breve é a reestreia do musical Nara, que volta em março aos palcos em São Paulo.

Uma das grandes homenagens que a cantora ganhou ocorreu há cinco anos. O estilista mineiro Ronaldo Fraga criou uma coleção inspirada em Nara Leão e encantou a São Paulo Fashion Week. “É um desfile que até hoje as pessoas comentam. Foi realmente lindo e emocionante. Cresci escutando essa MPB de ouro da qual Nara fazia parte. Na época, teve até quem me questionasse a escolha do tema. O que mais me chamava a atenção nela era como criador e criatura eram a mesma coisa. Ética e estética se misturavam. O meu grande estímulo foi que Nara tinha uma cara da moda e do nosso tempo, ela experimentou e criou estilos. Tinha uma personalidade admirável”, declara Fraga.

O estilista acrescenta que hoje pode parecer normal a trajetória da cantora, mas ela ousou e conseguiu passear por vários estilos como ninguém. “Muito do que as cantoras contemporâneas fazem, Nara já tinha feito. Ela começou na bossa nova, depois gravou Roberto Carlos, músicas nordestinas. Levou o morro carioca para dentro da casa dela. Fora a sua generosidade. Ela descobriu e revelou muita gente. Nara Leão é eternamente moderna”, destaca.

O desfile, que teve performance ao vivo de Fernanda Takai, acabou rendendo frutos. A vocalista do Pato Fu revisitou o repertório de Nara Leão em seu primeiro disco solo, Onde brilhem os olhos seus, lançado em 2007. Entre as canções gravadas estão Debaixo dos caracóis dos seus cabelos (Roberto e Erasmo Carlos), Diz que fui por aí (Zé Keti/Hortênsio Rocha) e Lindonéia (Caetano Veloso/Gilberto Gil). O projeto teve grande repercussão entre o público e a crítica.

Memória
Ela se tornou a musa
da bossa nova

Nascida em Vitória, Nara Lofego Leão era a segunda filha do casamento entre dr. Jairo Leão, advogado, e Altina Lofego Leão, professora. Sua irmã mais velha é a jornalista Danuza Leão. Desde menina, ela se interessou pela música, e, aos 12 anos, ganhou do pai o seu primeiro violão e passou a fazer aulas com o músico Patrício Teixeira, no Rio de Janeiro, para onde se mudou quando tinha apenas 1 ano de vida.
A bossa nova nasceu em reuniões no apartamento dos pais da cantora, em Copacabana. Foi durante esses encontros que ela conheceu seu primeiro namorado, o compositor Ronaldo Bôscoli. Além de musa desse movimento musical, Nara ficou conhecida como a intérprete de A banda. Mas foi também a responsável por trazer ao centro da MPB compositores como Cartola, Zé Keti e Nelson Cavaquinho, e lançar canções de nomes como o próprio Chico Buarque, Baden Powell, Carlos Lyra e Edu Lobo.
Nara foi casada com o cineasta Cacá Diegues, com quem teve dois filhos: Isabel e Francisco. A cantora morreu no dia 7 de junho de 1989, aos 47 anos, vítima de um câncer cerebral.

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