quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Documentário “Língua: vidas em português”


in diálogos lusófonos

“não há língua portuguesa, há línguas em português” 
 (José Saramago)
 
Interessante o comentário que vos passo sobre o Documentário “Língua: vidas em português”, do diretor Victor Lopes (Brasil/Portugal, documentário, 2003). Neste filme participam falantes da língua portuguesa de várias latitudes. Um filme muito oportuno, porque nos permite reconhecer a riqueza que da soma das culturas lusófonas. E, com certeza, se tivermos maior conhecimento deste potencial, daremos mais força à projeção das culturas lusófonas e à comunidade dos afetos. Diferentes mas com muitos elos...por reconhecer.
Por outro esta visão da diversidade das línguas em português é que explica a urgência do acordo ortográfico, que propõe apenas a "norma da grafia" e não impede a diversidade das pronúncias, tão rica, dos povos dos quatro continentes, em virtude da diferença de culturas, costumes e influências religiosas.
 
“Língua: vidas em português” é um documentário que foi filmado no ano de 2001 e lançado nos cinemas brasileiros no ano de 2004. Conta com a participação de falantes da língua portuguesa que moram em Portugal, Moçambique, Índia, França, Japão e Brasil. Durante as entrevistas, esses falantes expõem seu cotidiano e suas culturas. Além dessas personagens anônimas, o filme conta com a participação especial de José Saramago (escritor português, já falecido), João Ubaldo Ribeiro (escritor brasileiro), Martinho da Vila (cantor e compositor), Teresa Salgueiro (que foi integrante do grupo Madredeus) e Mia Couto (escritor moçambicano). O referido documentário é altamente recomendado para todos os estudantes da história linguística da língua portuguesa, pois mostra com clareza a variação da língua “falada” em cada região onde as filmagens ocorreram.
Quando estudamos as variações linguísticas que ocorrem no Brasil, observamos que no Sul a pronúncia se difere, em algumas palavras, da utilizada no Norte. Porém, não visualizamos a expressiva variação entre os falantes nativos da “nossa língua”, presentes nos quatro continentes. Na exibição do documentário, essa diferença na pronúncia é tão forte que, se exibido sem a legenda, o falante brasileiro acaba não entendendo ou tendo dificuldades para entender o português falado, em alguns países, pelos personagens do filme, inclusive em Portugal. Essas variações ocorrem em virtude das diferentes culturas, costumes e influências religiosas nos diversos países.
O Brasil com os seus 170 milhões de falantes e Portugal com os seus 10 milhões são os países com a maior quantidade de falantes nativos da língua portuguesa. Quando acrescentamos os falantes de Angola, Moçambique, Guiné, Cabo Verde, Goa, Macau, São Tomé e Príncipe, uma pequena parcela na Índia e mais os imigrantes no Japão, a quantidade ultrapassa os 200 milhões de falantes no mundo.
Fazendo uma conexão com as primeiras palavras de Marcos Bagno no livro “Preconceito linguístico, o que é, e como se faz”, onde ele escreve que só existe língua se houver seres humanos que a falem, percebemos então a arbitrariedade da gramática normativa “europeia” em impor as regras da “língua” a todos os falantes nativos. Pois, somente uma pequena parcela dos falantes (os cultos) utilizam corretamente na fala o que prescreve a gramática, na maioria das vezes em situações formais ou em discursos. Já os mais de 200 milhões de falantes levam todos os dias suas vidas em português, se comunicando, sobrevivendo e evoluindo de acordo com suas necessidades e realidade de suas comunidades.
Diante de toda essa diversidade de expressão, o escritor português José Saramago fez uma declaração interessante, para ele “não há língua portuguesa, há línguas em português”, em virtude das variações apresentadas nos falantes de um país para o outro. Considerando apenas a língua falada “entre todos os falantes nativos nos quatro continentes”, podemos utilizar os estudos do Mário A. Perini no livro “A língua do Brasil amanhã e outros mistérios” e verificar que não existem apenas dois mundos (escrita e fala em português). Em virtude das diferenças supracitadas em cada região, essa divisão se torna muito mais complexa. A gramática normativa dita as mesmas regras para a escrita nas diversas regiões, mas a expressão verbal, em cada uma delas, sofrerá sempre inúmeras variações dentro de cada comunidade de falantes, dividindo-se essa expressão em vários mundos, o que explica o não entendermos ou a dificuldade de entendermos a pronúncia de alguns dos falantes da “nossa” língua portuguesa.
AURENIDE JOSÉ DOS SANTOS


__._,_.___

Sem comentários:

Enviar um comentário