PODEMOS NÓS, OS GALEGOS DA GALIZA ESPANHOLA, RECLAMAR O NOME DE GALEGO PARA A LÍNGUA COMUM?
A CENA DO NASCIMENTO DE PORTUGAL
Alexandre Banhos:
VIII Colóquio da Lusofonia, Bragança - Outubro 2009
Nos feitos históricos, há sempre um fator de oportunidade e outro de acaso, mas uns e outros têm uma lei de ferro: O que não se passou quando as circunstâncias eram favoráveis e propícias, é dizer, quando as ondas do momento histórico pareciam impulsionar e acelerar a história, vai tornar-se muito difícil, que alguma vez aconteça. Com certeza que as circunstâncias e o acaso são em grande medida, um construto de pessoas humanas. Porém, passado o momento e mudadas as circunstâncias é muito difícil, por não dizer impossível, reconstrui-las. As circunstâncias nunca poderão voltar a ser as mesmas, pois isso é um impossível,[1] além disso, e como dizia Wilfredo Pareto, -cada novo facto que ocorreu vai pesar sobre nós como uma lousa, a história não é mais do que as lousas que nos esmagam-.
1- A Galiza e e as suas elites “iberistas”.
A Galiza foi de sempre um poderoso elemento da história europeia. Foi o primeiro reino independente dentro do império romano, constituído no ano 411[2]. O reino é conhecido na historiografia -mais corrente-, como dos Suevos, e na sua própria documentação histórica que nos legou, como Galaeciorum regnum.
O seu centro político foi estabelecido em Braga[3], por ser esta a capital da província romana da Gallaecia.
É dizer, o centro do reino estava na cidade que já era o centro da província romana da Galaecia –Braga-, e que provavelmente já tinha um rol muito importante no noroeste peninsular antes da chegada dos romanos. Não é por acaso que os castros celtas da sua redondeza, pola sua desmesura, foram denominados citânias.
Foi muito cedo – já na alta idade média- considerada a Galiza, como um dos grandes impérios da cristandade, junto aos impérios Bizantino e o Sacro-império Romano-Germânico.
Depois da invasão muçulmana do ano 711, a Galiza foi o território não ocupado pelos muçulmanos, de aí que grande parte das suas dioceses sejam as únicas da península ibérica com permanente continuidade, e foi ela quem liderou e guiou a luta da reconquista do território da Espanha.[4] Nem no periodo romano[5], nem no vissigótico, nem no muçulmano, a Galiza se confundiu com o espaço Espanha.
Os galegos da velha Galiza, a dos conventos bracarense, lucense (ártabra) e asturicense (astúrica – estes só ao norte da serra Cantábrica-[6]), os que nunca foram submetidos pelos muçulmanos, ou o seu domínio sobre eles fora muito fraco, -basicamente limitado ao penhor do tributo-, tinham-se pelos primeiros entre todos os peninsulares e não se abaixavam perante ninguém.
A Galiza, era o território peninsular mais densamente povoado, inçado de linhagens nobres que se tinham a si próprias, como iguais ao rei. Era pois, o ator mais poderoso no jogo peninsular.
As numerosas forças galegas resultavam o elemento mais temível da península ibérica e já desde muito cedo as cousas tornaram-se, e senhores muçulmanos acabaram pagando tributo e aceitando a sua prevalência.
Os reis da Galiza não eram simples reis, muito cedo usufruíram o nome de imperadores e como tais eram reconhecidos pelo Papa, pelo império Carolíngio e por Bizâncio. e para quem é tão grande a própria Galiza originária resultava pequena, e assim todos os dias estavam a alargar os seus domínios para o leste e para o sul e com eles avançava o domínio da cruz frente ao da meia-lua. E nas cabeças dos reis da Galiza acabará aparecendo o ensejo de coroarem-se com a península ibérica toda, eis o o projeto iberista galaico[7].
1.1- A cidade de Braga
A capital histórica da Galiza sempre foi Braga[8], nela já antes de que começara a era cristã fora colocada a cabeça da governação da primeira província romana -com esse nome-. A cidade de Braga estava por tanto por cima do resto das capitais dos outros conventos que formavam a província.
Ao princípio do avanço muçulmano a cabeça primaz da Galiza é trasladada desde Braga, que era como dizia, a capital da Galiza, desde que a Galiza existia como entidade política[9], para a cidade ártabra de Lugo (centro do convento lucensis)[10].
Os bispos de Lugo sempre que agem como cabeça, fazem-no com uma formula -por delegação de Braga- e isso vai-se manter durante toda a alta idade média.
2- O quadro histórico no que se insire o nascimento, muito afortunado[11], do reino de Afonso Henriques
A Galiza, o império galaico-leonês[12], desde muito cedo enfrenta a luta constante contra o separatismo castelhano.
Os castelhanos não aceitam muito pacificamente a dominação ocidental, a galega, e sempre estão a fazer levantamentos e resistências.
2.1- Aparecimento do reino de Castela no jogo peninsular
O reino da Galiza, desde muito cedo, teve que confrontar-se com o separatissmo de Castela, é dizer, do velho convento romano de Clúnia, incorporado à província da Galiza na época de Diocleciano. O arredismo dos castelãos informará permanentemente a política da Galiza.
Castela, o condado de Castela, vai conseguir a categoria de reino com o rei Sancho III (982-1035) de Navarra, quem por uma simples boda[13] com a herdeira do Condado de Castela separou o território da Galiza-Leão, e se proclamou rei de Castela, o seu primeiro rei[14]. Isso fala-nos do fraco controlo do território que o separatismo castelhano impusera ao controlo galaico[15].
Os castelhanos com ele sentiram pola primeira vez, um seu desenvolvimento longe do controlo real galaico. A geopolítica[16], que os colocou no espaço central peninsular, ajudaria ao seu sucesso, entanto a ação política se mover em coordenadas peninsulares.
À morte do rei Sancho III[17] de Navarra- vai ser o seu filho Fernando, quem herde o recém nado reino de Castela, em realidade um reino, que na Cúria leonesa considera-se só um condado[18] e não se reconhece.
As ondas da história que impulsionam os acontecimentos, farão que Fernando[19] venha a ter a posse também do reino da Galiza –é dizer, do império- (Galiza-Leão). A inércia e superior domínio cultural galaico, o role de língua palaciana que usufrui o galaico ocidental, era na altura um fator muito decisivo para trazer de novo o centro para o ocidente.
Fernando I, o imperador,[20] da Galiza-Leão, segue à sua morte, a doutrina do seu pai, e reparte territórios e posses aos seus cinco filhos.
Três reinos aos filhos: a Sancho, o mais velho da-lhe Castela.[21]. A Afonso Leão; e a Garcia o mais novo, a faixa mais ocidental cristã do velho reino da Galiza, a faixa cujo limes oriental eram os Montes de Leão, e que pelo sul tinha chegado muito mais longe que os outros reinos.
A Galiza aparece individualizada[22], e já sem abranger todo o velho império galaico. Temos aqui um reino, com uma Galiza diminuida com respeito ao alcance histórico anterior, mas que pelo sul avançara muito mais do que qualquer outro território ou reino cristão peninsular.
Para as suas duas filhas: Urraca e Elvira foram respetivamente as cidades de Samora e Toro.
2.2 Que faz Garcia como rei da Galiza
A primeira decisão que adota Garcia é a de que se ponha fim à delegação da condição de primaz de Braga em Lugo. Segundo, à restauração de Braga como cidade principal do reino.
Porem, nessa Galiza de Garcia[23], estava uma cidade que ainda havia pouco que conseguira ser sede de bispado -Compostela-, para onde deslocara-se a velha sede de Íria Flávia como cabeça do maior bispado da Galiza.
E é essa poderosa Compostela,[24] a quem o Apostolo está a encher de ouro e de ambições, quem, digamo-lo suavemente, não gosta do rei Garcia e a sua política bracarense. Compostela nasceu ambiciosa, e como sé apostólica, e não quer aceitar depender de quem era a cabeça primaz da Galiza, Braga[25].
O reino da Galiza de Garcia, não era já um pequeno espaço no norte, pelo sul há já tempo que tem incluída a região coninbringensis, e tem já por zonas a sua extrema no rio Tejo. A Galiza de Garcia cobra também tributo das poderosas taifas de Badalhouce (Badajoz naquela altura) e Sevilha.
2.3- Uns irmãos reis muito ambiciosos
Tanto Sancho, como Afonso ambicionam terem todos os territórios do seu pai na sua coroa, e tras uma sorte de guerras e maus feitos entre eles. Afonso vai acabar por juntar de novo os três reinos, Galiza, Leão e Castela.
Sancho, o primeiro dos irmãos, considerava que o reino devia ser todo um e dele todo, por ser o primogénito, com a cumplicidade de Afonso quem herdara Leão e a sua sede curial, e com a colaboração necessária do bispo de Compostela[26], desfazem-se de Garcia com uma cilada, retendo-o e apoderando-se do seu reino[27]. Sancho proclama-se rei da Galiza, mas as suas contínuas guerras com Aragão e Navarra, faz que na prática seja Afonso desde a sua sede curial quem tem o controlo e tira benefícios da Galiza.
Sancho estabelecida a paz com Aragão e Navarra, lança-se com as suas tropas bem treinadas pelo seu permanente estado de guerra, contra Afonso, ao que pronto derrota e acabou fazendo-se com todos os seus territórios e reino, ainda que a posse deles não chegará nem a um ano. Afonso refugiara-se no território muçulmano, mas ainda tem no seu reino a resistência da sua irmã Urraca[28] desde a sua cidade fortaleza. Assaltando Samora, a fortaleza de Urraca, é assasinado com engenho, falece Sancho, e Afonso acaba sendo o rei único de todos os territórios.
2.4.- O reinado de Afonso VI e os borgonhois
Afonso VI foi um rei que não só passou a história por ser o conquistador de Toledo, senão pola sua complicada vida familiar. Afonso tem cinco matrimônios[29], vários concubinatos estáveis e relações com várias mulheres, do que ao final só vão resultar filhas sobreviventes.
Um dos matrimónios de Afonso VI, o segundo e de mais duração[30], foi com Constança de Borgonha (do que sobreviveu a filha Urraca); este matrimónio levara-o a ter certa estabilidade de relações com Borgonha, e que para a corte viessem desde Borgonha vários cavaleiros, tais como os nobres borgonhóis Raimundo e Henrique.
No ano 1090, o Rei Afonso casou a sua filha e herdeira Urraca, com Raimundo de Borgonha, matrimónio ao que se garante o reino da Galiza à sua morte.
Raimundo muito faz por agradar ao Rei, fortalece a cidade estratégica, por estar na fronteira sul, de Ávila,[31] e dirige continuas guerras contra o domínio muçulmano, especialmente no sul da Galiza.
Outro nobre borgonhão que veu à corte, vai ser Henrique, e a quem o rei casa no ano 1095 com uma outra filha sua, Teresa, uma rapazita de uns 10 ou 11 anos[32], resultado dumas suas relações com uma moça de nome Jimena Nunes, e de quem não se conhece título nenhum.
Henrique é posto sob o domínio de Raimundo e encarregado de guardar a extrema sul da Galiza. Sob Raimundo a extrema da Galiza estava já no rio Tejo. Raimundo tentou por duas vezes assaltar Santarém, foi numa das suas batalhas pelas extremas do reino na que faleceu.
Urraca viúva com o seu filho Afonso acha apoio protetor no poderoso bispo Gelmires de Compostela e na casa dos Trava, e é reconhecida da Galiza emperatriz à morte do seu pai, porém quando ela casa com Afonso o Batalhador rei de Aragão, pronto Gelmires -apoiando-se na vontade de Afonso VI, faz rei da Galiza o seu filho ainda criança -duns 7 ou 8 anos- no ano de 1111 (Afonso -Raimundes- VII)[33], que era filho de Raimundo e Urraca[34]. Neste rei acha Gelmires um instrumento das suas ambições políticas.
3- Afonso Henriques
Na Braga restaurada por Garcia não gostam da política imperial e desconsiderada da recém chegada Compostela e começa a dar-se uma conjunção de interesses entre o bispo de Braga, verdadeiro factor do processo que virá, e as classes dominantes locais.
Henrique de Borgonha como conde de Portucale, o condado ao sul da velha Galiza, tem a inteligência política de passar despercebido, e ir construindo ali um governo local tranquilo, no que age, e à vez não discute a autoridade real.
Os bispos de Braga afirmam-se contrários de Compostela[35] desde muito cedo.
A Compostela de Gelmires chegará a fazer uma expedição a Braga para roubar o espólio de santos ali depositado[36] –Pio Latrocínio- e ganhar assim prestígio da vero caput para Compostela, e veneração dos galegos, por serem os santos de Braga os de mais prestígio na Galiza, alguns muito por cima do próprio Sant'Iago.
Henrique de Borgonha com Teresa tem um filho, Afonso Henriques. Aceita-se que desde o ano do seu nascimento, 1109 até ao 1128 viveu fundamentalmente em Guimarães, exceto o período do desterro do bispo de Braga, o seu tutor, que o levou consigo para Tui pelo menos durante algum tempo.[37]
A mãe de Afonso Henriques, ficou viúva estando na casa dos 20 anos.
Todo isto faz que a igreja de Braga - desde o bispo Vistrário um dos mais fortes apoios do rei Garcia, e logo o grande Pedro[38]- com o apoio da nobreza local, se afirmem como contrapostos à ambiciosa sé apostólica. Eles defendem os seus interesses que além de outras cousas eram os legítimos e históricos.
Em 1120, sob a direção do arcebispo de Braga Paio Mendes, o menino Afonso[39] (uns 12 anos) tomou uma posição política oposta à da mãe, a qual apoiava o partido dos Travas (a poderosa família nobre muito ligada a Gelmires nessa altura). Como resultado desse posicionamento, o bispo Paio é forçado a deixar Braga, mas levou consigo o infante pelo menos algum tempo. Em 1122 armou-no cavaleiro em Tui.
Pacificadas as tensões, voltará o bispo a Braga. Entretanto, novos incidentes locais provocaram a ação no Condado Portucalense do rei da Galiza Afonso Raimundes, mas cada dia ele está mais longe, pois somará à Galiza, Leão e Castela.
Em 1127 cerca Guimarais[40], onde se encontrava Afonso Henriques, mas sendo-lhe prometida a lealdade deste pelo seu aio Egas Moniz, Afonso VII desistiu de conquistar a cidade.
Mas alguns meses depois, em 1128, as tropas de Teresa e Fernão Peres de Trava defrontaram-se com as de Afonso Henriques na batalha de São Mamede (batalha na que participaram só uns poucos centos de homens), tendo as tropas do nosso rapaz de 17 ou 18 anos, com a bênção e o guia do bispo de Braga, saído vitoriosas – o que consagrou a sua autoridade no território portucalense, levando-o a assumir o governo do condado.
O Bispo Paio, consciente da importância das forças que ameaçavam o poder de Henriques, guiou a este no governo do condado, e fez esforços em negociações junto da Santa Sé, com um duplo objetivo: por um lado, alcançar a plena autonomia da Igreja de Braga[41], e assim recuperar a sua condição de igreja metropolitana e primaz, e deixar de estar submetida a Compostela, -pois fora submetida a de Compostela-;[42] e pelo outro obter o reconhecimento do condado de Portucale como um reino.
Em 1139, depois de uma estrondosa vitória na batalha de Ourique[43] contra um forte contingente mouro, D. Afonso Henriques recebe a coroa e a consagração de Rei de Portugal pelo bispo de Braga.
Durante o século seguinte o novo reino de Portugal[44] e os seus reis, estabelecem uma firme política matrimonial e de entendimento com os reis da Galiza especialmente Fernando II e Afonso VIII, que parecia ia levar em não muito tempo aos reinos a reunificarem-se, ou pelo menos a reunificarem-se com a Galiza.
4- Afonso VIII da Galiza e Leão
Em 1230 morre em Sárria (perto de Lugo) Afonso VIII com 82 anos e após de mais de sessenta anos de reinado na Galiza -na parte norte da Galiza que não constituiu o reino de Portugal - e em Leão.
Afonso estava velho e canso, vinha de passar os últimos 16 anos da sua vida em guerra com Castela e o seu filho Fernando, pois foi contra o parecer do pai, e em secreto, proclamado rei de Castela, e para o seu pai esse feito equivalia a renúncia de quaisquer direitos sobre as coroas da Galiza e Leão e assim figurou no seu testamento, verdadeira lei a todos os efeitos.
Afonso VIII casara com duas parentes de segundo grau, Teresa de Portugal, prima direta, com quem tem duas filhas Sancha e Dulce (e um filho Fernando que faleceria), matrimónio que a igreja rompe e obriga a novo casamento (por trás está Compostela e a tensa relação com Braga). Rutura a que muito se resistiu o nosso rei pois estava fundamente namorado da sua esposa. Depois de excomunhões e demais, tem um outro matrimónio com Berenguela filha de Afonso de Castela, também prima direta, com quem tem a Fernando, mas este matrimónio a igreja consente e apoia pois estava na linha do programa imperial peninsular da Galiza e Compostela.
O seu testamento é claro, as herdeiras dos seus tronos são as filhas de Teresa: Sancha e Dulce (cada uma o seu); e como garantes, a sua mãe, o Rei de Portugal e a Ordem de Santiago. Qualquer solução incluída a união com Portugal é válida mas em nenhum caso se permitiria a unificação com Castela.
Fernando reclama os reinos e paga muito. A Igreja da Galiza e de Leão está muito dividida e na sua maioria afirma-se contrária a Fernando, pois não o acham legitimado, o testamento do rei é lei e é claro.
Porém a intervenção do bispo de Compostela e os de Castela são decisivos para que o Papa declare ilegítimo o testamento de quem foi conhecido pelos seus súbditos pelo sobrenome do bom rei, e pola historiografia como o malcasado.
Compostela e certas camadas nobres galegas sentem que com Fernando III controlam o centro geoestratégico peninsular, que o seu projeto iberista vai avante.
Porém, o reino de Portugal nunca aceitará esse ilegítimo acordo, e isso vai estar por trás de muitas das ações da política peninsular portuguesa até ao ano de 1479[45].
Com Fernando III, rei muito abençoado pola Igreja, que acabou por fazê-lo santo, o projeto central castelhano avança, e a reconquista avança até ao estreito de Gibraltar, em Sevilha e Toledo vai estar a corte sob a capa duma corte de nobres galegos, de língua galaico-portuguesa, com galegos que se enriquecem neste processo, que ganham terras e poderes, que enviam os filhos para se educarem com aios na Galiza, como o filho do rei e futuro rei Afonso X.
Afonso X[46] que brilhou nas nossas letras, porém foi quem impulsionou o primeiro estatuto dominante para a escrita da chancelaria em castelhano.
Sancho IV seu filho, ainda vai continuar ligado à tradição cultural galaica. A chegada ao trono com 9 anos do seu filho Fernando apaga não pouco essa tradição, sob novos tutores e aios, e o predomínio e domínio galaico da corte reduze-se. A nobreza galega e a igreja de Compostela será firme no apoio a este rei como ainda um dos seus e assim com o filho deste Afonso XI e o neto Pedro I.
Os interesses imperiais de Castela e a sua visão peninsular triunfam definitivamente sobre os galaicos com o assassinato de Pedro I pelo mercenário bretom Douglesclin, e com a chegada ao trono de uma dinastia genuinamente castelhana sob o nome galaico dos Trastámaras.
As tropas galegas que se batem duramente em prol de Pedro, assassinado este, saem com a sua nobreza dirigente muito diminuída em influência.
A dinastia castelhana dos Trastámaras[47] é a que vai tentar apoderar-se de Portugal, que renasceu forte e triunfante em Aljubarrota frente a João I de Castela (trastámara).
V.- A fortuna do feito por Afonso Henriques
Que houvesse passado se Afonso Henriques não fosse quem de iniciar um reino, se os bispos de Braga não o houvessem guiado?
Que mudou com respeito à tradicional política da Galiza ao nascer Portugal?
A monarquia portuguesa frente ao modelo imperial do norte, sempre com aspirações iberistas, centrou-se sobre si própria e em consolidar pouco a pouco o seu território, que ficava de costas à península, mas aberto ao mar.
Sancho I, Afonso II, Sancho II, esforçam-se nessa linha de conduta[48].
Se a criança Afonso Henriques e a sua cabeça pensante, o bispo de Braga, não fossem quem de achar um destino para o sul da Galiza afastado de projetos imperiais peninsulares que estavam no projeto de Compostela, hoje teríamos a Galiza “unificada” no estado-espanhol -desde a Estrema do Tejo (estremadura) até o Cantábrico, mas a sua vida cultural e linguística não seria sequer tão pobre como a da Galiza atual; pois para a nossa língua e cultura, frente ao sucesso mundial atual, as tendências existentes na altura no reino da Galiza, e a sua deriva histórica após Afonso VIII, indicam que hoje teríamos toda a península dominada por Castela-Espanha, e com certeza a língua num estado muito degredado.
Nesse espaço “unificado”[49] que se estenderia como dizia do Tejo até o Cantábrico, é muito improvável que nesse espaço haver unificação da língua nem de nome nem de outro tipo, seria um território que estaria hoje em dia dividido entre umas três comunidades autónomas diretamente e parcialmente entre outras duas pelo menos, e cada uma teria a sua academia o seu nome para as falas, e a sua degradação, todas seguindo o modelo do atual astur-leonês, que tem restos de falas também no sul do seu espaço, como por ex. o castuo da diocese de Cória e Plasência no norte da estremadura espanhola. (O modelo dos problemas nominais do catalão, nas quatro comunidades autônomas espanholas nas que está, também servem para olharmos isso a pesar do processo histórico desta língua ser distinto).
Com certeza que se alguém usufruir o nome de galego nesse espaço, não seria toda a comunidade autónoma atual da Galiza espanhola, e sim o território bracarense.
O nascimento de Portugal para as gentes da Galiza naquela altura foi um feito absolutamente pacífico entre os galegos do norte de sul do Minho, pois como tais galegos, se consideravam todos nessa altura[50].
Além disso, todos os movimentos com algum sucesso para a Galiza vir a recuperar a sua soberania (a partir de 1230) que se vão suceder até 1476, (vide nota 45) estiveram sempre ligados a ação de Portugal, como volveram a estar ligados a Portugal ao começo do levantamento de 1640 quando em certos sectores da Galiza e Portugal se espreita por essa possibilidade.
Quando a Galiza espanhola teve ocasião de agir e sair do domínio do castelhano, -sem a ação de Portugal que foram; - quando as intervenções na Galiza da Inglaterra de Isabel Bolena. – E com o seu próprio exército e governança na guerra peninsular de 1808-14, mas nesses dous casos careceu de dirigência que se formular essa possibilidade, de pensar na Galiza como actor político não submetido[51].
As guerras civis de classes na Galiza, as guerras irmandinhas -muito mitificadas pelo nacionalismo- careceram de alternativas e projetos de país, e indiretamente foram muito importantes para a não vitória de Toro, e sim para que na Galiza tiverem sucesso, a guerra terrível dos reis católicos após Toro, e estes finalmente virem-se a consolidar e domar o país com o ferrete castelhano.
Se o feito maravilhoso de Portugal nascer, não se ter produzido, a situação presente seria muito semelhante à que se vive no âmbito astur-leonês-mirandês, é dizer, no velho espaço do galaico-oriental[52].
Essa visão que Portugal tinha de si próprio oposta ao iberismo galaico, é a que o levará a ser um centro dum império com as costas viradas a Península, e ter o grande sucesso que teve, para fortuna da nossa língua portuguesa.[53]
O português da Galiza
O português da Galiza ou galego da Galiza, até para o mais acérrimo isolacionismo, foi muito vivificado pelo português universal da corte de Lisboa, sem o português o galego, os falas da Galiza espanhola, derivam num mau dialeto do castelhano e com um espelho muito claro para ver isso, a deriva e o insucesso do galaico oriental ou astur-leonês.
O português da Galiza -as falas do português da Galiza- tirado o muito que sugou e continua a sugar do português, estaria limitado a uns dialetos rurais bastante fraturados e os seus utentes só teriam para beber e encher os ocos criativos nele com o castelhano, como é o que se passa nos restos que ficam do galaico oriental (com a exceçom do mirandês que bebe no português).
O sucesso da nossa língua e cultura (ao norte e ao sul do Minho) deve-se ao projeto que encetou Afonso Henriques virado de costas ao projeto iberista (imperial) e originário galaico.
Na Galiza não temos direito a reclamarmos nada sobre o nome internacional da língua, já que se não fosse por Portugal, nada seriamos, nem nada teríamos ao norte e ao sul do Minho.
A Galiza medieval, vive em realidade em Portugal. Portugal é o continuador verdadeiro dessa tradição, a que nós, pouco podemos achegar ao além de estar os nossos falares bem marcados pelo ferrete castelhano. Dizer Galiza e a sua língua e a sua tradição, é dizer Portugal e português.
Afonso Henriques (com o seu bom guia), da Galiza do sul fez um Portucale, um reino, e o galaico ou galego desse reino acabou por ter por nome o do próprio reino, o galeguíssimo nome de Portugal[54] –português-.
O português da Galiza está na situação que está, por não sermos quem de assumirmos que os falares galegos só podem viver no português universal[55], e que falarmos de galego como contraposição ao português universal -o verdadeiro galego- e seguirmos pagando as portagens imperais de Castela-Espanha.
Assumirmos os falares da Galiza como português da Galiza é o melhor jeito galego de chamarmos ao galego da Galiza, para que possa ser ele próprio e duma tradição que arrincou em Braga no 411, e que está no cerne de Portugal, e libertarmo-nos assim do ferrete esmagador castelhano.
O único futuro do galego-castelhano é um só -espanhol-.
APONTAMENTO FINAL
Como galego, a mim serviu-me Portugal[56] para duas cousas, a primeira descobrir que do que não gosto de Portugal é o facto de terem em grande medida os nossos próprios defeitos; e a segunda o muito espanhol que são quando às vezes me afirmo como galego, pois Portugal para fortuna nossa e da nossa língua e cultura universal, não é Espanha com certeza, e ao confrontarmo-nos com não espanhóis, serve, se somos sérios e abertos, para descobrirmo-nos, introspecionarmo-nos os galegos e galegas, e vermos de que jeito tam esmagador estamos inseridos e baliçados no espaço hispano, até para os acérrimos nacionalistas galegos.
Faz bem Portugal em estar sempre à espreita e com receio do que vem do norte do Minho, pois muito contrabando espanhol e espanholista se vende sob capa de presumido galeguismo, e ainda muito projeto imperial galaico (espanhol) paira ainda em cabeças galaicas no avanço para o nada, e para nenhures.
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- Manuel galego Português de História- Edição do autor 1996
Merecem especial menção por terem sido os seus trabalhos muito influentes na perspectiva destas reflexões historicistas, os múltiples artigos e reflexões de Ernesto Vasquez Souza, e alguns trabalhos divulgativos do presidente da Associação Fala Ceive do Berzo, Xavier Lago Mestre.
[1] Na historiografia vimos de passar um período em que se fazia muita força no colectivo, nas multidões e o seu efeito, porém em toda multidão há sempre uma liderança, umas pessoas, e qual seja o génio dessas pessoas é decisivo, para que as cousas se tornem dum jeito ou de outro.
[2] Ainda que o primeiro rei Hermerico, parece que foi coroado no 409 ou 410 em Braga, há consenso historiográfico em que é no 411 quando o reino estabelece o seu pacto foedos com Roma, e se confirma juridicamente como tal reino.
No ano 2011, estaremos no 1600 (número cabalistico cheio de bondades e bons agoiros) aniversário da constituição do galaeciorum regnum; foi nas suas entranhas que nasceu a nossa língua portuguesa desse baixo latim galaico ocidental, é foi ele, o forno e o formento da idiossincrasia galaico-portuguesa ou galaico-lusitana.
Aguardamos que as autoridades de Braga e do norte de Portugal sejam quem de converter esse aniversário num processo de valorização cultural, do seu role no nascimento de Portugal, de estudos sobre a diocese de Braga.... Pode ser um bom exemplo o projecto da cidade de Aquisgrão quando a celebração no 2000 do 1200 aniversário da proclamação de Carlos Magno como imperador do sacro-Império.
[3] Em Braga neste período criou-se a figura dos Concílios que com posterioridade serão adotados por outros reinos como o vissigótico. A Galiza também vai ser a inventora, nos governos de Afonso VII, Fernando II, e Afonso VIII da figura da reunião das cortes com participação da nobreça, a igreja e a nascente burguesia conhecidos inicialmente como consilios e deseguida com a denominação de cortes.
[4] A Galiza não formava parte da Espanha. Para os galegos Espanha era o território muçulmano. Nas atas dos concílios de Toledo sob os vissigodos, figuram os bispos que neles participam e figuram os bispos da Hispânia, da Galaecia, e da Narbonensis ou Septimánia, sem darem lugar a nenhuma confusão.
[5] Como tem vindo a demonstrar trabalhos linguísticos como os do professor Higino Martins entre outros, o nome de Hispânia, romano, abrangia só as províncias bética e cartaginense, o seu alargamento às províncias da lusitânia e tarraconensis tem um caráter parcial e não sistemátíco, porém a Galaecia não estava incluída nunca nessa denominação. Em definitivo Hispânia era a orla mediterrânea cujo centro de origem terminológico estava nos atuais territórios da Andaluzia-Múrcia.
[6] As Astúrias ao norte das serras, o que chamam nas Astúrias detrás do cordal, acabou usufruindo o nome do velho convento
[7] Isso sim, nada semelhante com o posterior “projeto” de Castela
[8] Na Galiza de mais ao norte, na Galiza ártabra (que norte é o que se significa esse velho nome céltico – de ártabro-) também há aldeias que levam o apelido -de galegos- pelo simples facto de serem elas povoadas com população deslocada das zonas de Braga - Porto, pois na alta idade média acabaram por usufruir de jeito muito específico o nome de galegos, e levavam esse nome por onde quer que eles se estabelecerem
[9] Segundo o professor Higino Martins, há dados para considerarmos que Braga já tinha um role muito importante na Galiza, antes da conquista romana.
[10] Quando o processo de transição política na Espanha após a ditadura franquista, penso que alexandre Banhos foi uma das poucas pessoas que escreveu sobre que lugar deveria ser a capital da Galiza autonómica. (dava-se um debate Compostela – Crunha), e Banhos propunha Lugo polas seguintes razões. -Era a velha capital da Galiza Ártabra e foi a delegada de Braga. -Ajudava a reequilibrar o território, pelo efeito da nova centralidade, e até a vermos o espaço da Galiza doutro jeito. - E por último, se a Crunha foi o espaço da audiência (a primeira criação dominadora dos reis católicos após a derrota militar da Galiza) e centro das estruturas do domínio de Castela, Compostela e o seu projeto religioso respondeu sempre a um projeto contra dos interesses galaicos. Acho que há forças telúricas no território que se trasladam aos genes dos espaços e das urbes e que se projetam no tempo, e esses genes para capital autonómica, não eram os melhores.
[11] Para a nossa língua e cultura foi um grande sucesso, como logo se verá.
[12] Cuja única língua palaciana era o galaico ocidental – o português daquela altura-
[13] O matrimónio foi no estado monárquico, e até muito recentemente o principal ato diplomático desses regimes, o elemento no qual havia que pôr mais cuidado.
[14] Como rei de Castela, foi o primeiro em usar o nome de “hispaniorum” que viria a ser profético em certo jeito. O reino da Galiza-Leão (e o papado), não reconheceram a entidade de reino de Castela até ao reino de Sancho, filho de Fernando I.
[15] É uma cousa muito engraçada, o facto de como a historiografia espanhola ordenou e numerou os reis de Castela, de jeito tal que vieram a aparecer como continuadores de outros reinos, “desaparecido” o separatismo castelhano, substituído por uma espécie de luta centralizadora (centrípeta) e de construção da Espanha, da que só se livrou Portugal pola vontade do seu povo, erguendo-se o primeiro de dezembro de 1640. A Título de exemplo teve Castela dous Afonsos como reis, mas não os numeraram de I e II, e sim de VII e VIII.
[16] O da geopolítica nunca e matemático, funciona em prol dos interesses centrais mentres a política de todos espaços e territórios peninsulares se centrarem no espaço peninsula. Quando Portugal se converte em centro dum império e vira as costas à península esse efeito geopolítico deixa de ter lugar. vide A. Banhos 1994. A Galiza fronteira entre Portugal e Espanha.
[17] Nesta altura ainda não existe nada que se possa identificar com o conceito moderno de nacional, o reino é uma própriedade, a honra do rei, e este reparte-a entre os seus filhos do mesmo jeito que faria qualquer bom pai com o seu património. O termo nationis vai ser usado por primeira vez na universidade de Paris no século X para designar os distintos alunos pola sua língua, nationis germánica, nationis italiana....
[18] Conseguiu a coroa da Galiza-Leão ao se casar com dona Sancha irmã do rei Vermudo III.
Galiza-Leão não aceitava à Castela independente e Fernando levantou-se em guerra contra Vermudo, na guerra este morreu sem deixar descendentes e Fernando casando com a irmã conseguiu as coroas.
[19] Fernando é nome galaico, em Castela – Navarra a forma do nome é Hernando, Isso fala-nos dos modelos palacianos galaicos.
[20] A partir dele todos os imperadores e reis da Galiza-Leão estão sepultados na Catedral de Santiago de Compostela, dentro do atual Museu Catedralício na chamada Capela dos Despojos. Esse feito no lugar está oculto a todos os visitantes e dele nada se informa, o que contrasta com o que se passa em São Isidoro de Leão, na catedral de Oviedo, O Escorial... e o destaque que nesses outros lugares se faz das pessoas reais ali sepultadas.
[21] É o primeiro rei de Castela, e como tal juridicamente reconhecido, pelos reinos peninsulares e pelo Papa.
[22] A fins do século IX começara a se perceber no território da Galiza uma diferença entre a Galiza oriental e a ocidental. O latim da Galaecia, o latim proto-galaico cindia-se em dous ramos o galaico ocidental e o galaico oriental, intimamente conetadas, mas que se percebiam já como variantes. Uma dará lugar ao português (denominado galego nos documentos daquela altura) e outra o galaico oriental, ao que os linguístas modernamente denominarão astur-leonês e em Portugal mirandês, e nos documentos dos primórdios da monarquia portuguesa braganciano, pois o reino de Portugal nos seus inícios tinha a divisão linguística da Galiza com um galaico oriental (galor) que ocupava uma importante faixa oriental do norte do reino.
Ainda que há documentação escrita medieval em galaico oriental, toda a documentação indica que a única língua palaciana no reino era o galaico ocidental, o nosso português daquela altura, de aí o tipo de documentação tão distinta que há nos dous galaicos, oriental e ocidental, no ocidental temos uma brilhante poesia e prosa destinada ao consumo das elites “palacianas”. E no oriental são só de tipo administrativo forais, com alguma escasíssima exceção.
Os chamados Montes de Leão eram o limes da Galiza oriental com a Galiza ocidental. Isto contrastava com a documentação alto medieval, por ex.nos comentários do apocalise de São João obra do beato da Liebana-em Cantábria- designa como Galiza todos os territórios do reino. Os reis na sua correspondência diplomática exterior tambem se definem como reis da Galiza...
[23] O agir de Garcia, foi decisivo, para que o papa desse o título religioso de arcebispo ao seu Prelado, sendo Padro o primeiro com esta condição.
[24] O mito do sartego de Sam Tiago em Compostela, no lugar onde repousavam os venerados restos de Prisciliano, foi criado provavelmente na corte dos Francos -apareceu sem antecedentes no ano 813- no reinado de Afonso II; foi um elemento ideológico muito importante para dar força ao reino galego que emergia frente ao poderio muçulmano peninsular, e frente a primacia católica toledana que estava sob o domínio muçulmano.
Nas excavações feitas na Catedral, o que se tem achado anterior à sua existência, foi um cemitério priscilianista. Há certeza histórica de que os discípulos de Prisciliano trasladaram os seus restos desde a cidade de Tréveris, onde foi decapitado, para a Galiza.
Sant'Iago o maior, foi decapitado em Jerusalem no ano 44, e não há certidume da sua presença ibérica de feito demonstrável; à Galiza não chega o cristianismo antes do século III, nem por suposto que logo fosse trazido para à Galiza numa barca de pedra. Curiosamente de isso nada se falará na Galiza antes do invasão peninsular dos muçulmanos, e a lenda foi criada no século VIII. De estarem nalgum sítio os seus restos, é na Igreja Arménia de Jerusalem, dedicada a Sant'Iago, e na que fixava a tradição cristiã os restos de Sant'Iago, até à criação do mito compostelano.
A imaginação levou a desenvolver a ideia de que Compostela, vinha de Campus estelae (-campo da estrela- divina que indica o lugar do achado do sartego apostólico). Mas a filologia,- por ex. Josep Piel -nos Estudos de Linguística Histórica galego-portuguesa -imprensa nacional Casa da Moeda-- e muitos outros, têm estabelecido que o nome de Compostela vem de Compositae Villa é que vem a apontar que era uma vila bem feita, bem composta, e além disso, é um topónimo não restrito à cidade senão que é o nome de mais lugares, e todos têm a mesma origem, um compositae villa.
[25] No ano 1095 o bispo de Compostela Dalmácio consegue do Papa a não dependência de Braga. Compostela passa a depender diretamente do Papa e pensar que ainda fora o seu predecessor o que deslocara a sé diocesana de Íria a Compostela. No 1109 com Gelmires Compostela passa a ser sede arcebispal, e pronto Gelmires, com muito ouro consegue ser o legado papal e ter dependetes dele os metropolitanos de Braga e de Mérida.
[26] Não é casual que os restos de Afonso o imperador, vieram finalmente a repousar na Catedral de Compostela.
[27] Há duas teorias sobre o fim de Garcia, uma que fala de que acabou preso em Burgos e depois em Leão, e outra que acabou fugindo e instalando-se em Sevilha sob a proteção de quem governava naquela Taifa tributária da Galiza, todos os dados parecem indicar que a segunda foi a que efectivamente se produziu.
[28] Curioso nome o de Urraca, um celtismo que fala ainda do substrato desta língua na Galiza, Urraca, tal como tem demonstrado Higino Martins, é um nome céltico que significa mulher do rei, ou mulher igual ao rei.
[29] Do matrimónio-concubinato com a viúva do rei de Córdova (a muçulmana Zaida –ainda que a historiografia cristianizou-a como Isabel) teve com ela duas filhas e o seu único filho. A relação nasceu sendo ela a esposa do rei de Cordova, viúva ela passou a ser a sua concubina mais estável, e logo viúvo ele, acabaram casando. O filho com ela foi Sancho a quem ele muito amava. Este filho era o seu olho e a quem queria de herdeiro de Castela, porém morreu na batalha de Uclês (o ano 1108, tinha o filho 17 ou 18 anos) e isso dá-nos para conhecermos na crónica De Rerum Hispaniae do bispo de Toledo (cidade que Afonso conquistara), o pranto do rei pelo seu filho (Ay meu fillo! Ay meu fillo, alegria do meu coraçom e lume de meus ollos, solaz de mia vellece! Ay meu espello en que me soía veer e con que tomaba gran prazer! Ay meu herdeiro mor. Cavaleiros u me lo leixaste? Dade-me o meu fillo, Condes! – o qual aparece inserido no texto latino na nossa língua portuguesa (ainda que daquela se chamasse galego), o que nos vem a falar de qual era a língua palaciana, a língua dos reis, do poder e da corte.
[30] Durou até o falescimento desta no 1093.
[31] Nos documentos antigos era A Vila
[32] Há quem alarga a idade de Teresa até os 12 recem cumpridos, mas tudo parece indicar que era algo mais nova.
[33] Quem ao reino da Galiza acabará juntando, andado o tempo, os de Leão e Castela
[34] Todas as dinastias que vai haver na Galiza, Leão, Castela e Portugal, vão ser descendentes dos borgonhóis e concretamente de Raimundo, incluída a de Portugal pelo seu cruzamento com ela. A primeira dinantia desse espaço desligada desta origem, vai ser a castelã dos Trastámara que eram castelhanos ainda que tiveram recibido um título galego – o condado de Trás-Támara (de trás do rio Tambre), território um pouco ao norte de Santiago de Compostela.
[35] Uma Compostela à que acabou submetida Braga, graças ao muito ouro de Gemirez levado para o Papa.
[36] Mas nem com o apóstolo Compostela conseguia projetar-se por cima de Braga na Galiza, e para os galegos, os santos de mais prestígio eram os que estavam em Braga concretamente São Frutuoso e Santa Susana. O poderoso bispo de Compostela Gelmires organizou um assalto nocturno a sé de Braga (ano de 1102) e a outras igrejas da localidade, para roubar e trazer para Compostela os venerados restos para todos os galegos, dos santos que ali estavam -Frutuoso, Susana, Cucufate, Silvestre e alguns outros (A Frutuoso e Susana mandou erguer duas igrejas em Compostela Gelmires). Ainda que Braga conseguiu a ordem do Papa Pascual II de ordenar o retorno, só na década dos 90 do século XX se assinou a paz entre Braga e Compostela em presença do Papa João Paulo II, e Compostela pôs como condição para a paz, não ter que devolver a Braga a integridade do roubado, só parte dos restos e dos restos devoltos seguiria parte em Compostela, cousa que Braga acabou por aceitar. (A igreja de Compostela definiu o acto como o pio latrocínio).
[37] Há historiadores que deslocavam esse desterro a Samora, mas dos últimos dados e da pesquisa histórica, pode-se afirmar que o desterro foi no paço bispal de Tui -na actual Galiza espanhola- na beira do rio Minho, (bispado muito achegado a Braga, e que até muito avançado o século XIX ainda incluía o distrito português de Viana do Castelo).
[38] Faz falta um bom estudo sobre o agir da Igreja de Braga na constituição de Portugal como reino, dado que foram o elemento decisivo.
[39] As idades do rapaz fazem muito dificil imaginá-lo com qualquer casta de posição política bem determinada
[40] Passou além disso uma cousa, ao estar montando o cerco, faleceu a sua mãe rainha de Leão e a ele corresponde o reino, além disso iniciou os processos para recuperar Castela que estava sob o governo de Afonso de Aragão como resultado do matrímónio da sua mãe Urraca com o rei de Aragão, pronto frustrado, mas do que ficou Castela para Aragão.
[41] Braga por ser a primaz da galiza segue a ser a primaz de Portugal, andando o tempo veu ter problemas com Lisboa que aspirava a ser a primaz, Braga defendeu isso bem e Lisboa com ouro conseguiu a declaração de patriarcado, ser a sé dum patriarcado.
[42] As ambições da Compostela de Gelmires e o seu agir “apostólico” levaram a fazer que o território coninbrigense passasse a depender de Compostela e não de Braga. Braga (fraca políticamente agora no jogo peninsular) tem o problema de que um Toledo ainda há pouco reconquistado tenta também fazer depender o território coninbrigense de Toledo, mas aí ganhou a batalha Compostela a Toledo. Compostela em determinada altura sonha já não com suplantar a Braga, (que já o estava fazendo) como cabeça da Galiza, senão a Toledo na Hespanha, pola sua condição de sé apostólica. Compostela e a sua ambição funciona como um motor da política iberista galega.
[43] Ourique está na raia do Algarve, o qual nos fala do avanço que a reconquista tinha na faixa ocidental peninsular.
[44] Ao falecer Afonso VII deixara Castela para seu filho Sancho e a Fernando Leão com a reduzida Galiza. (Os portugueses quando estudam a historiografia espanhola não conseguem enxergar o porquê da numeração dos reis de Castela, desconhecem que a historiografia faz-se pro domo sua
[45] Os reis de Portugal, depois de 1230, entendem que toda a Galiza lhes pertence e corresponde ao seu reino, não só o sul dela. São vários a serem proclamados reis da Galiza: Fernando I, D. João I também o tenta, Afonso III, D. João II. O derradeiro foi Afonso V, que no apoio à rainha legítima de Castela Joana, frente à usurpadora Isabel, negociou a reintegração da Galiza à sua coroa. A batalha de Toro o dia 1 de março de 1476 vai ser decisiva para a renúncia da coroa portuguesa à Galiza ao norte do Minho. Essa não vitória de Toro e a renúncia do rei à coroa da Galiza, leva a política matrimonial com Castela da que virá o periodo Filipino, e para a Galiza, a uma guerra de Castela contra dela, desde 1476 até 1489, na que é absolutamente raziada e submetida, começando o processo conhecido da Doma e Castração do Reino da Galiza – em palavras do cronista de Castela. A batalha de Toro, supõe o desaparecimento prático da Galiza como território independente.
[46] Em realidade a numeração do rei deveria ser IX, mas como a numeração dos únicos dous Afonsos de Castela a historiografia espanhola numera-os como VII e VIII, para unificar as duas linhas, designaram a Afonso VIII da Galiza como IX.
[47] A casa de Trastámara.- O rio Támara virá a dar no rio Tambre, uns poucos quilómetros no norte de Santiago de Compostela, esse condado era em origem um título nidiamente galego. Porém esse título fora entregue pelo rei Afonso XI a uma família genuinamente castelhana e sem eles terem nada a ver com a Galiza.
[48] O projecto central imperial português, absolutamente virado de costas ao resto da península, que se produziu apos 1640, também vai ser fulcral no sucesso de Portugal e na criação dum novo império, e no sucesso da nossa língua. Depois de 1640, a corte portuguesa deixa de ser o forno pelo que estava entrando o castelhano na nossa língua, como um rio..
[49] “Unificado” só por estar todo ele dentro do estado espanhol
[50] No romance de José Saramago O Cerco de Lisboa, facto que corresponde já à monarquia portuguesa, recolhe este feito narrando que os galegos conquistaram Lisboa, e diz, que naquela altura, ainda os moradores do reino nom adoptaram o nome do reino e sguiam a se chamar todos a sim próprios de galegos.
[51] De facto em muitas cabeças galegas segue empoleirada uma visão da Galiza em relação a sua acção política peninsular, enquadrada nas mesmas coordenadas do Compostelanismo, ainda que hoje em dia dum jaito incrivelmente mais degradado. É esse um pensamento um jeito de ver as cousas que se pode achar num Pousa Antelo (fundação Castelão), num Baltar (Presidente da Deputação de Ourense e muito tradicional não o feijoista) ou num Quintana (dirigente do Bloco Nacionalista Galego).
Tomo-me a liberdade de colocar estes nomes por serem pessoas que conheço, penso que estão nesse enquadramento e tenho-as seguido e escuitado, poderia pôr muitíssimos outros exemplos. Peço desculpa aos mesmos, sabendo que o meu apontamento a título de exemplo é absolutamente subjetivo, e que pode que não se corresponda a realidade e estar eu totalmente errado.
[52] E bem seguro que nele haveria uma peiade de academias para falarmos da realidade de n~ao sei quantas línguas e variantes nesse espaço. Castela é genial dividindo.
[53] A nossa verdadeira pátria em palavras de Pessoa.
[54] O nome de galego, procede dos moradores nas beiras do Douro, na atual Porto, o Porto Cale traduzido a linguagem corrente o Porto dos Galegos. Eis um lugar que deu nome à Galiza e a Portugal.
[55] Um recente trabalho linguístico amossava como a farda do galego atual é a que adota a língua portuguesa por todo lado, quando esta está muito influênciada pelo castelhano, ou erosionada por ele..
[56] Se os judeus de todo o mundo se sentem orgulhosos de reconstruirem a sua pequena pátria de 20.000 km quadrados, que orgulho teriamos que sentir todos os galaicos do norte e do sul do Minho, que graças a circunstâncias históricas continuamos vivos em Portugal, e é Portugal o nosso porto refúgio o nosso acochego, e no português internacional, que o português da Galiza pode segurar o seu único futuro, alem de sendo ele próprio.
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