sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

NATAL REINTERPRETADO

IN DIÁRIO INSULAR




CUNHA DE OLIVEIRA INTERPRETA A BÍBLIA
Maria não era virgem
e o menino não nasceu em Belém

PRESÉPIO tem pouco de verídico, mas celebra o nascimento de Jesus
Cunha de Oliveira desmistifica algumas das ideias criadas sobre o nascimento de Jesus, no seu mais recente livro, entre as quais a de que Maria, sua mãe, seria virgem fisicamente.
A história contada no presépio sobre o nascimento de Jesus tem pouco de verdade, na opinião do teólogo Artur Cunha de Oliveira.
Licenciado em teologia dogmática e em ciências bíblicas, o terceirense tem passado a sua vida a estudar a Bíblia e lança agora um livro sobre a quadra que se avizinha. "Natal. Verdade. Lenda. Mito" é o título da obra, apresentada este sábado, pelas 19h00, na galeria do Instituto Açoriano de Cultura.
Para o investigador, o Evangelho foi mal interpretado, tendo dado origem a muitas lendas e alguns mitos.
"A não ser o facto do nascimento do Senhor Jesus, nada daquilo que está ali escrito corresponde à história, a factos", frisou, em declarações a DI.
Uma das falsas ideias transmitidas pela Igreja, segundo Cunha de Oliveira, é a de que Maria, mãe de Jesus, era virgem.
"Maria foi virgem, mas como mãe verdadeira perdeu a sua virgindade física", defendeu, acrescentando que, ainda assim, ela "não perdeu a virgindade espiritual e psicológica, porque virgem tem o sentido de pureza" e como mãe e mulher era "perfeita".
"É digna da maior consideração e da maior veneração, mas não façamos dela virgem", sublinha.
O erro partiu desde logo da tradução de hebraico para grego, de uma frase de Isaías, segundo o teólogo, porque em hebraico está escrito jovem e em grego virgem.
Para Cunha de Oliveira a expressão "obra e graça do Espírito Santo" foi mal entendida, porque apenas pretendia dar "um caráter religioso à conceção de Jesus".
"Quando se diz por obra do Espírito Santo não quer dizer que tenha sido o Espírito Santo, porque ele não tem espermatozoides, nem ia criar um espermatozoide especialmente naquela altura, mas houve uma ação divina na conceção natural humana de Jesus", salienta.
Segundo o teólogo, na cultura pagã havia também a ideia de que os deuses nasciam de virgens, o que terá influenciado os cristãos.

CUNHA DE OLIVEIRA lança este sábado uma obra onde separa a verdade, a lenda e o mito, na história do nascimento de Jesus
MENINO NASCEU EM CASA
Na leitura de Cunha de Oliveira, Jesus nasceu em Nazaré, porque todos o chamam de nazareno e a viagem a Belém é outro mito.
Para o investigador o recenseamento que é utilizado como desculpa para a viagem não existiu e se tivesse existido, Maria e José tê-lo-iam feito em Nazaré, "a não ser que tivessem propriedades em Belém", mas nesse caso teriam também quem os acolhesse, por isso cai por terra a ideia de que dormiram num estábulo.
"Como é que na iminência de Maria poder dar à Luz, José, que deveria ser um marido decente, obriga a mulher a vir oito dias de burro, senão a pé, de Nazaré a Belém, para se recensearem? Porque é que não veio um mês antes ou um mês depois? Foi mesmo na altura do nascimento?", questiona.
Nesse sentido, defende que o menino nasceu em casa, como qualquer outro nazareno e cita uma passagem sobre os Reis Magos, que diz que "ao verem a estrela sentiram imensa alegria e entrando na casa viram o menino com Maria, sua mãe".
Já nos Reis Magos e na luz que os guia, Cunha de Oliveira não acredita. "Não houve visita nenhuma de reis magos, mas é uma lenda que empurra para a ideia de que até os não judeus vieram reconhecer", frisa, acrescentando que a fuga para o Egipto é outra lenda.
De acordo com o investigador, os relatos da Bíblia não podem ser interpretados à letra, como se da realidade se tratasse. "São comentários que se fazem, mas não é a história que se faz", defendeu, acrescentando que "foram elaborações literárias livres".
Dos quatro evangelistas, apenas dois referem o nascimento de Jesus, mas com versões diferentes. "Se a gente olhar o Evangelho da infância de Mateus e a correspondente narrativa de Lucas, não concordam um com o outro", salienta.
Cunha de Oliveira não tem por isso qualquer problema em validar que o Papa tem razão quando diz que o burro e a vaca não aqueciam o menino com o seu bafo, porque acredita que Jesus nasceu "em casa, não foi num curral".
"Quando S. Francisco de Assis, no século XII, faz o primeiro presépio, trouxe de facto um jumento e um boi para ilustrar o nascimento, mas não que o Evangelho fale de boi e de jumento", alega, salientando que "há uma poética de S. Francisco de Assis que quis associar a natureza a festa do nascimento e daí por diante começou-se a copiar".
DI --

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