Da crise de 2012 ao resgate de 2013
Há uma linha profunda que separa
2012 de 2013.
Chama-se “empobrecimento” e
parece não ter fim à vista.
No final de 2012 há nos Açores
cerca de 20% da população em risco de pobreza (a taxa de risco mais
elevada do país), enquanto os mais ricos do país ganham quase 10
vezes mais do que os pobres.
Mais de 50 mil açorianos vão
entrar no novo ano a ganhar menos de 400 euros, que é o limiar da
pobreza, 21% das empresas regionais vão estar em risco de falência,
o desemprego vai continuar a aumentar e poderá atingir os 20% e
continuaremos cada vez mais dependentes do exterior, porque não
fizemos o trabalho de casa nas últimas décadas.
Ainda acham que há razões para
desejar um Bom Ano, sabendo que ele vai ser péssimo?
Eis 10 etapas que marcaram 2012 e
que vão perdurar em 2013.
- “Entroikados” com a crise
A crise que se abateu durante todo o
ano deixou marcas profundas.
O desinvestimento privado e as
dificuldades no acesso ao crédito bancário mexeram com a economia
açoriana, apesar da propaganda governamental ao congratular-se com a
“resistência da economia regional à crise”.
Por cada semana que passou em 2012,
quatro famílias ou empresas dos Açores entraram em insolvência –
um aumento de 185% em relação ao ano anterior.
De 2011 para 2012 o desemprego
aumentou na região de 9 para 15%!
A nossa balança comercial tem um
défice do tamanho da cratera das Sete Cidades.
De todas as empresas da região,
apenas 1,4% exportam, o que representa um valor ridículo para uma
região que já deveria estar a gerar riqueza suficiente para se
tornar menos dependente.
A troika está a pôr muita coisa no
seu devido lugar, mas há outras que são nitidamente o resultado da
mediocridade política que temos.
- O fim do ciclo cesariano
Foi o acontecimento mais marcante
de 2012. O fim da era de Carlos César abre novos caminhos para uma
outra geração de políticos.
Vasco Cordeiro, Duarte Freitas,
Vitor Fraga, José Manuel Bolieiro e outros da mesma geração não
podem falhar, porque representam a única esperança que ainda nos
resta no meio de tanto descrédito que a velha classe política
assentou durante 2012.
Haja rigor nas decisões e mais
mérito nas promoções.
Houve muitos interesses instalados
nestas últimas décadas e muita gente a viver à sombra de
compadrios políticos.
O facilitismo não pode continuar a
imperar numa região tão frágil e com desequilíbrios sociais tão
acentuados.
- Desemprego a galope
O desemprego foi o maior flagelo de
2012 e é mais que certo que vai galopar em 2013.
Mais de 20 mil desempregados em
ilhas onde o investimento e a criação de riqueza é como agulha em
palheiro, este vai continuar a ser o maior problema social dos
Açores.
Tudo isto a somar a mais cerca de 20
mil beneficiários do Rendimento Social de Inserção e a um terço
da população que já vive abaixo do limiar da pobreza, estão
reunidas as condições para um caldo social explosivo.
Não admira que, de três em três
meses, 130 casas sejam entregues à banca e as instituições de
solidariedade estejam a abarrotar de pedidos de esmola.
4. Turismo e SATA
O ano fica também marcado pela
forte recessão no sector do turismo na região.
Não é só a crise. Foram, também,
políticas erradas e uma falta de estratégia confrangedora.
Só em promoção gastaram-se
dezenas de milhões nos eventos mais disparatados e sem retorno,
desde vacas em Lisboa, camelos nos Açores e paisagens nos táxis de
Londres. Foi um fartar de adjudicações por ajuste directo, sites
virtuais a rodos e um mar de disparates.
A SATA é, também, uma das
principais causas deste descalabro.
A gestão incompreensível da sua
política de tarifas agravou o fosso e ajudou a enterrar, ainda mais,
um sector já de si desregulado e muito dependente da estratégia dos
governos.
Creio que vamos levar muitos anos a
recuperar.
Até lá, a imagem que perdura é a
mesma do famoso Casino-Fantasma em Ponta Delgada, representando,
emblematicamente, a degradação que se vive no sector.
5. Universidade e RTP-Açores
São duas instituições da nossa
Autonomia que representam bem o pensamento de uma certa política
cada vez mais discutível: queremo-las como nossas, mas o Estado a
pagá-las.
Está visto que não vai ser assim.
O Estado vai desobrigar-se, cada vez mais, de responsabilidades nas
Regiões Autónomas, com o argumento de que não tem receitas
suficientes para chegar a tudo.
A Universidade e a RTP-Açores foram
vítimas, em 2012, da nova política que vai fazer escola no Terreiro
do Paço, aliada à habitual passividade dos políticos regionais.
Cabe à Região enfrentar, sem
medos, o futuro das duas instituições e saber, junto da sociedade,
o que é que os açorianos querem para cada uma delas.
Não pode é haver mais demoras.
6. Este homem existe?
Se o Estado desobriga-se de algumas
responsabilidades na Região, a Região também deveria desobrigar-se
de algum paternalismo do Estado.
Por exemplo, o Representante da
República.
Ele existe? Alguém dá pela falta
dele? Serviu para quê em 2012?
7. Base das Lajes
Nem de propósito. Quem ocupa hoje a
cadeira do Representante da República é um Embaixador que esteve
bastante envolvido nas negociações com os Estados Unidos, no âmbito
dos Acordos de Cooperação, devido à Base das Lajes.
Alguém ouviu uma palavra da figura
representativa da república?
A retirada dos americanos haveria de
acontecer um dia, porque sabemos que o mundo mudou muito.
O nosso problema, o nosso espanto, é
que não nos preparamos para isto.
Como sempre, só acordamos para os
nossos problemas quando somos confrontados com o agudizar deles.
Raramente planeamos.
Geralmente chegamos tarde.
8. O resgate que vem aí
“Memorando de Entendimento entre
o Governo da República Portuguesa e o Governo da Região Autónoma
dos Açores” - nome pomposo para dizer que, durante os próximos 10
anos, a região passa a ser controlada pelo poder central (vai
começar com a nova Lei de Finanças Regionais).
Andamos estes anos todos a gastar à
tripa forra, tal como o país, sem cuidar da criaçaõ de riqueza.
Nas últimas duas décadas foram
investidos nos Açores cerca de 25 mil milhões de euros, qualquer
coisa como 100 mil euros por cada habitante.
Qual a riqueza que tudo isto gerou?
Deste total, é provável que 16,6
mil milhões – dois terços do investimento – terão saído da
região para pagar importações, serviços externos, juros de
empréstimos bancários, etc.
Mesmo assim, continuamos a gastar
sem saber o que produzimos.
Tudo agora vai piorar.
Começando pela saúde, com os três
hospitais regionais em falência técnica.
Só de empréstimos bancários, os
três hospitais passaram de 7,5 milhões de euros em 2008 para 64,3
milhões em 2009 – 8 vezes mais em apenas um ano.
2012 foi a corda ao pescoço.
Com as receitas próprias da região
a cobrir apenas 86% das despesas correntes, como é que vamos
continuar a sobreviver?
- Políticos a mais
Em 2012 foi evidente que há
instituições políticas e gente delas dependentes a mais no país e
na região.
Vasco Cordeiro corrigiu no governo,
diminuindo os departamentos e as chefias.
Falta agora a Assembleia Regional, a
única que aumentou os seus efectivos e as suas despesas.
Gastar mais de 12 milhões de euros
por ano para tanta gente e tão pouco trabalho produzido (o último
mês de 2012 foi mesmo de gazeta), é uma provocação para a
restante sociedade açoriana, que vive com um rendimento médio de
700 euros.
O escândalo ia sendo maior em 2012
quando se descobriu que, devido ao fantasmagórico aumento de
eleitores nos cadernos eleitorais, a Assembleia Regional quase que
engrossava para 64 deputados.
Não fosse a pressão pública e os
movimentos cívicos, e hoje teríamos um parlamento ainda maior.
- Desertificação nas ilhas
A crise financeira e os problemas
associados a toda a economia deixaram escapar um problema muito sério
que se começa a agravar no país e na região.
Há fortes sinais de que vamos
assistir a um défice demográfico muito acentuado, que pode pôr em
causa o futuro de algumas ilhas.
O número de mortes está a
ultrapassar largamente a quantidade de nascimentos.
Até ao final de Novembro tinham
nascido no país pouco mais de 83 mil bébés, menos 6 mil do que
igual período de 2011.
É uma curva que se inclina a 7%. É
como se não tivesse nascido 14 vezes toda a população do Corvo.
Nos Açores ainda não são
conhecidos os dados totais, mas é muito provável que acompanhe a
tendência nacional.
Nos Censos de 2011 a região tinha
aumentado ligeiramente a população, mas apenas em S. Miguel,
Terceira e Corvo,
Todas as restantes ilhas perderam
nuita população e, segundo o pouco que se conhece deste ano, a
tendência é para se agravar.
Trata-se de um problema muito
complicado para a região.
Numa altura em que se fala tanto de
coesão regional e desenvolvimento harmónico, se não houver
população não há coesão que resista.
Poderá ser a falência de um
projecto e de uma região.
Pico da Pedra, Dezembro 2012
Osvaldo Cabral
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