QUINTA-FEIRA, 7 DE FEVEREIRO DE 2013
Resposta à Resposta de António Pinto Ribeiro: "Ainda a Lusofonia"
António Pinto Ribeiro e a “esquerda” anti-lusófona
O Senhor António Pinto Ribeiro (APR) entendeu responder-me (“Para acabar de vez com a lusofonia”?!, PÚBLICO, 02.02.13) com um texto (07.02.13) onde, persistindo nalguns equívocos grotescos, faz ainda algumas alegações absurdas – quer sobre a minha pessoa, quer sobre o movimento cultural e cívico a que presido. Daí a necessidade de mais estes esclarecimentos – sobretudo em defesa do bom nome de uma instituição apoiada por muitas das mais relevantes personalidades da nossa sociedade civil e que conta já com mais de 20 milhares de adesões de todos os países e regiões do espaço lusófono:
1. Acusa-me APR de confundir “língua portuguesa e a suposta cultura lusófona”. Esclarecimento: não confundo; apenas não tenho da língua uma visão estreitamente instrumental; ao invés, defendo, na esteira de muitos outros filósofos, que há uma relação fundante entre língua e cultura – neste caso, entre a língua portuguesa e a cultura lusófona (cultura, como não me canso de reiterar, necessariamente plural e heterogénea, ou, para usar um único termo bem lusófono, “mestiça”).
2. Acusa APR o MIL de ser “nacionalista”. Esclarecimento: o MIL não é “nacionalista”; tem, ao invés, teorizado o conceito de “trans-nacionalismo lusófono”. Absurdo será, de resto, qualificar um movimento que defende o reforço dos laços com os restantes países lusófonos – no plano cultural, social, económico e político –, prefigurando até, em última instância, uma “União Lusófona”, como um movimento “nacionalista” (qualquer neófito em Filosofia Política compreende isto).
3. Acusa APR o MIL de ser “de direita e nostálgico do império”. Esclarecimento: o MIL não tem qualquer “nostalgia do império” (apenas não renegamos, ao contrário de APR, toda a nossa história, resumindo-a à “expressão da barbárie”), nem somos “de direita”. Pessoalmente, considero até essas categorias completamente ultrapassadas – mas, a usá-las, então direi que no MIL há pessoas mais “de esquerda” (como, por exemplo, o nosso sócio honorário Fernando Dacosta) e mais “de direita” (como, por exemplo, o nosso também sócio honorário Adriano Moreira). Aliás, no seu artigo, para procurar fundamentar a sua alegação, atribui-me uma afirmação que não é minha – mas do meu amigo Miguel Real, Presidente da Assembleia Geral do MIL (um pensador claramente “de esquerda”, para retomar a sua terminologia), extraída (azar dos azares!) de um texto publicado, no início do ano, neste mesmo jornal (“O Sentimento do Nada, a Confiança e a Esperança”, PÚBLICO, 04.01.13). Usando de novo a sua terminologia, tratar-se-á aqui de “excesso de interpretação”, “fantasia”, “má-fé” ou “incompetência” (neste caso, hermenêutica)?
4. Mas prossigamos. Acusa-me APR de, no meu (necessariamente curto) texto, não “citar um único autor africano”, para daí, uma vez mais, fazer deduções abusivas. Basta, para esboroar essas suas deduções, apontar o exemplo da revista semestral que o MIL promove desde 2008: a NOVA ÁGUIA, REVISTA DE CULTURA PARA O SÉCULO XXI. Em quase todos os seus números, temos publicado textos de autores africanos. O mesmo acontecerá já no próximo (nº 11), a sair em Março, a respeito do tema “O Mar e a Lusofonia”.
5. Finalmente, acusa APR o MIL de utilizar “uma linguagem bélica contra o Estado e a Europa”. Vamos por partes: o MIL não tem utilizado uma “linguagem bélica contra o Estado” – apenas, tão-só, contra os sucessivos Governos que nos têm (des)governado (ao contrário de APR, não confundimos Governo e Estado; defendemos até que o Estado deve manter, sob seu controle, instrumentos fundamentais de governação, o que cada vez mais tem deixado de acontecer – temos publicamente defendido, por exemplo, que o Estado português deve manter a RTP e a TAP, até para promover as relações com os restantes países e regiões do espaço da lusofonia); quanto à “linguagem bélica contra a Europa”, limitei-me a usar uma expressão sua (“estilhaço”) para caracterizar a situação actual da União Europeia (nas páginas do PÚBLICO, de que sou leitor diário, tenho detectado expressões bem mais “bélicas”).
6. Como no seu texto anterior, só num ponto APR consegue acertar, mas apenas de forma truncada: quando diz que o MIL “fundamenta a sua existência num sonho de Agostinho da Silva”. É verdade que, tal como sonhou Agostinho da Silva (mas não apenas), defendemos a “criação de uma verdadeira comunidade lusófona, numa base de liberdade e fraternidade”. Por isso, defendemos também um “Portugal lusofonamente multicolor” (outro conceito nosso). De resto, bastaria isto para desfazer qualquer confusão entre o MIL e a “direita mais nacionalista”, que, como se sabe, defende, ao invés, um “Portugal branco”, étnica e civilizacionalmente (apenas) europeu – de quem (ironia das ironias!) a “esquerda” anti-lusófona de APR está bem próxima. E, ao invés, bem distante de nós: em diversos locais, já temos sido acusados pela tal “direita mais nacionalista” de querermos um “Portugal de pretos”. O mundo é bem mais complexo do que APR julga.
Renato Epifânio
Presidente do MIL: Movimento Internacional Lusófono
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